É possível uma relação entre estado nutricional e a Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA)?
DOI:
https://doi.org/10.62827/nb.v23i1.3009Abstract
Entender os rumos que a ciência e especificamente a Nutrição tem dado nos estudos para doenças neurodegenerativas como a ELA pode representar uma luz numa caminhada muitas vezes dura e complexa para o paciente, sua família e todos os profissionais da saúde que o acompanham. Para nós profissionais da saúde o desafio é gigantesco pois muitas vezes a ELA é apenas a “ponta o iceberg”, fatores nutricionais podem e parecem ser essenciais no curso dessa doença e é isso que pretendemos refletir um pouco aqui.
Não há verdades prontas, mas temos algumas setas, indicativos nesse caminho e a Ciência da Nutrição tem se empenhado nesse sentido!
O que a ciência tem apontado é que a ELA parece ter maior risco de eclosão quando correlacionamos alta ingesta de gorduras, excesso de glutamato e e β-metilamino-L-alanina. Em contrapartida, a ingesta de antioxidantes e anti-inflamatórios como, por exemplo, curcumina, creatina, coenzima Q10, além de vitaminas A,C,E poderiam reduzir o risco de ELA. Mas por que reduzir? Pela controvérsia de dados, poucos estudos randomizados-controlados, número limitado de amostragem e bilhões de variáveis envolvidas. Fato que chama atenção na atualidade é a alternância da microbiota intestinal por dietas inadequadas – predispondo a danos ao metabolismo e aparecimento de doenças neurodegenerativas como a ELA. Evidências sugerem que os hábitos alimentares em diferentes países podem explicar a diferença na incidência de ELA em todo o mundo. O estresse oxidativo, um dos principais gatilhos contidos no arcabouço fisiopatológico da ELA, pode, em parte, ser explicado pela ingestão de determinados componentes.
Vê-se ainda a alta incidência de ELA na península de Kii (Japão), por provável ingesta de β-metilamino-L-alanina (BMAA). O BMAA, um aminoácido não proteico neurotóxico natural é produzido por uma cianobactéria simbiótica nas raízes das sementes de cicadáceas (Cycas micronesica) que estão particularmente presentes nesta área. Nessa primeira região, o BMAA fora encontrado em altas concentrações em frutos do mar e peixes. Na ilha de Guam, cuja população é conhecida por “Chamorros” uma hipótese é a ingesta de raposas voadoras (morcegos frugívoros). Tais animais alimentam-se de cicadáceas em potencial e a concentração na massa muscular possui níveis extremamente altos de BMAA. Como os habitantes consomem a carne de morcegos, ingerem altos níveis de BMAA de forma secundária. Pesquisas embrionárias têm apontado a relação entre BMAA, leucina e arginina com mecanismos de apoptose neuronal e degeneração.
Outros estudos utilizaram ratos recém-natos (destaca-se aqui ainda em fase experimental e com testes em animais – poder de evidência para seres humanos não testado) e os expuseram à ingesta de BMAA. Desordens motoras foram identificadas durante a marcha desses animais e perguntas deflagradas sobre a ingesta de (BMAA) e possíveis danos durante o desenvolvimento neural. Uma das pesquisas que chamou atenção fora desenvolvida por Rao & Chiu, além de co-autores. A direta conclusão fora: a BMAA provoca morte dos neurônios motores (NADPH-diaphorase) por ativação nos receptores AMPA|kainate, além de contribuir na homeostase de células gliais.
Com relação à alimentação processada de gorduras saturadas em pacientes com ELA, os resultados são divergentes. A ausência de defesa contra altos níveis de “espécies” oxigênio reativo em mutações no gene SOD1, associada ao consumo de fast food, foram decifrados e apresentados em pessoas com ELA. Na contramão, diversos pesquisadores buscam derrubar tal hipótese com resultados sinalizando o oposto – uma ingesta de alimentos ricos em gordura como fator de proteção. O glutamato, um vilão temido na alimentação, também merece papel de destaque, pois é o principal neurotransmissor excitatório do Sistema Nervoso Central. Encontra-se presente em leites e derivados, alimentos hiper proteicos e em espécies de cogumelos. Tais neurotransmissores provocam incremento de cálcio intracelular com possível apoptose neuronal. É evidente, até o final desse editorial, que não chegaremos a um consenso. Entretanto hábitos mais saudáveis na alimentação devem ser levados em consideração.
A curcumina foi estudada como tratamento, usando um modelo celular semelhante à ALS gerado por mutação da TDP-43. Viu-se que a dimetoxi-curcumina, presente na curcumina, possui efeito protetor na membrana mitocondrial, diminuindo os níveis de proteínas desacopladoras. Vale destacar que um ensaio clínico isolado demonstrou que 12 meses de tratamento com nanocurcumina e riluzol aumentou a taxa de sobrevivência em pacientes com ELA. A curcumina não apresentou efeitos toxicológicos adversos graves em humanos.
Quanto à utilização de creatina, que é um composto sintetizado a partir de arginina, glicina e metionina, ensaios clínicos realizados em humanos, não apresentaram valores expressivos para sua utilização, há estudos em andamento.
Médicos e profissionais de nutrição utilizam a coenzima Q10 em dietas específicas para melhorar a atividade mitocondrial e como antioxidante. Estudos que buscam associar COQ10 como fator de proteção ou alentecimento do processo de doença foram falhos.
O uso de determinados suplementos vitamínicos tornou-as quase uma verdade absoluta, atualmente. Entretanto, devemos nos perguntar o porquê e para quê? Inúmeros indivíduos “repõem” vitaminas com suplementos, mesmo com índices normais. O termo, em algumas dietas seria “potencialização”, sendo que essa pode implicar em problemas. Em pacientes com ELA, por anos, eram utilizadas com fins de antioxidação. Nenhum estudo comprovou a eficácia da vitamina E em altas doses. Veldink J.H e colaboradores, em um estudo com metodologia razoável, sinalizaram que a associação de vitamina E associada a ômega-3, reduz o risco em torno de 50% de desenvolvimento de ELA. Embora a suplementação de vitamina E possa ter um papel protetor em doenças neurodegenerativas, sua eficácia ainda precisa ser demonstrada com rigor científico. Nenhum estudo apontou eficácia da vitamina A em ELA, seja no gerenciamento da doença ou como fator de proteção.
Estudos anteriores demonstraram que a ingestão de carotenóides está inversamente correlacionada com o risco de ELA (frutas, verduras e legumes). Chama-nos atenção a função dos polifenóis (principais compostos fenólicos) na neuroproteção, um grupo de pigmentos vegetais que deriva da flavona e suas características antioxidantes, pró-oxidantes e na remoção de radicais livres. Ressalta-se o papel na neuroinflamação com silenciamento da micróglia.
Devemos ressaltar que, embora não façam parte da dieta, alguns alimentos podem ser tóxicos por bioacumulação, bioampliação e...
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