Fisioter Bras. 2024; 25(1):1051-1062
doi:10.62827/fb.v25i1.g055

ARTIGO ORIGINAL

A paracentese é capaz de alterar a função pulmonar de pacientes cirróticos com ascite?

Is paracentesis able to change pulmonary function of cirrhotic patients with ascites?

Andrielli Inocêncio1, Jéssica Canizelli Gonçalez1, Davi de Souza Francisco1, Mariana Nunes Lúcio1, Carolina Luana de Mello1, Thais Martins Albanaz da Conceição1, Elaine Paulin1

1Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), Florianópolis, SC, Brasil

Recebido em: 12 de setembro de 2023; Aceito em: 6 de março de 2024.

Correspondência: Elaine Paulin, elaine.paulin@udesc.br

Como citar

Inocêncio A, Gonçalez JC, Francisco DS, Lúcio MN, Mello CL, Conceição TMA, Paulin E. A paracentese é capaz de alterar a função pulmonar de pacientes cirróticos com ascite? Fisioter Bras. 2024;25(1):1051-1062. doi:10.62827/fb.v25i1.g055

Resumo

Introdução: Sabe-se que a ascite se destaca como origem de limitações nutricionais, físicas e funcionais do paciente cirrótico. O reflexo negativo da ascite na alteração da pressão intra-abdominal e intratorácica fundamenta a importância da investigação da função pulmonar desses pacientes nos momentos pré e após a paracentese. Objetivo: Comparar a função pulmonar de pacientes cirróticos com ascite, antes e após a paracentese. Métodos: Estudo observacional com nove pacientes cirróticos realizaram paracentese no ambulatório de hepatologia do Hospital Universitário Polydoro Ernani de São Thiago, da Universidade Federal de Santa Catarina. Os pacientes foram submetidos à avaliação da capacidade de exercício por meio do teste de caminhada de 6 minutos (TC6). A avaliação antropométrica e da função pulmonar, foi realizada pré e pós paracentese. Para análise estatística foi realizado o teste de Shapiro-Wilk para avaliação da distribuição dos dados e teste de Wilcoxon para comparação da função pulmonar. Resultados: Não houve diferença estatística na função pulmonar pré e pós a paracentese e na distância percorrida no TC6 comparado aos indivíduos saudáveis. Conclusões: A paracentese isoladamente parece não alterar a função pulmonar. Sendo assim, importante investigar os efeitos das terapias de reexpansão pulmonares associadas ao tratamento clínico nessa população.

Palavras-chave: cirrose Hepática; paracentese; espirometria; capacidade pulmonar total.

Abstract

Introduction: It is known that ascites stands out as the source of nutritional, physical and functional limitations in cirrhotic patients. The negative impact of ascites on changes in intra-abdominal and intrathoracic pressure underlies the importance of investigating the lung function of these patients before and after paracentesis. Objective: To compare lung function in cirrhotic patients with ascites, before and after paracentesis. Methods: Observational study with nine cirrhotic patients who underwent paracentesis at the hepatology outpatient clinic of the Polydoro Ernani de São Thiago University Hospital, Federal University of Santa Catarina. Patients underwent exercise capacity assessment using the 6-minute walk test (6MWT). Anthropometric and pulmonary function assessments were performed pre and post paracentesis. For statistical analysis, the Shapiro-Wilk test was performed to evaluate data distribution and the Wilcoxon test to compare lung function. Results: There was no statistical difference in lung function before and after paracentesis and in the distance covered in the 6MWT compared to healthy individuals. Conclusions: Paracentesis alone does not appear to alter lung function. Therefore, it is important to investigate the effects of lung reexpansion therapies associated with clinical treatment in this population.

Key words: liver Cirrhosis; paracentesis; spirometry; total lung capacity.

Introdução

Dentre as alterações sistêmicas que favorecem a intolerância ao exercício e impactam negativamente na qualidade de vida dos pacientes cirróticos, destaca-se a ascite [1,2,3,4]. O acúmulo de líquido na região abdominal é comumente apresentado no estágio final da doença [5,6], gerado principalmente pela hipertensão portal como consequência à vasoconstrição e efeitos neuro-humorais compensatórios para retenção hídrica [7,8,9,10]. Atinge cerca de 60% dos pacientes dentro dos 10 anos subsequentes ao diagnóstico, onde 5 à 10% manifesta-se de forma refratária, relacionada ao aumento da mortalidade da doença [11,12,13,14,15].

A ascite induz o paciente à má nutrição, deficit circulatório e sarcopenia [2,16,17,18], fatores intimamente ligados à diminuição na qualidade de vida, e pior prognóstico da doença [2,11,12,19]. Além destas alterações, também dificulta a mecânica respiratória e potencializa a deterioração da função pulmonar, justificada pelo aumento da pressão intra abdominal, dificultando a mobilidade diafragmática e consequentemente a expansão pulmonar [6,14, 20, 21].

Como primeira escolha de tratamento indica-se a paracentese [13,22], considerada de alto volume quando superior à 5 litros [23]. Esse procedimento favorece a mecânica respiratória via redistribuição das pressões intratorácicas e intra abdominais essenciais à expansão pulmonar, auxilia na homeostasia e na neutralização do posicionamento diafragmático [8,20,21,24,25]. Contudo, são raros os estudos que abordam o efeito da paracentese na função pulmonar destes pacientes [6,14,21] e inexistente os que realizam a comparação de medidas no período antes e após o procedimento, dificultando o conhecimento sobre seu efeito na função pulmonar. Considerando, que a redução do volume abdominal poderia melhorar a excursão do músculo diafragma e consequentemente a função pulmonar, é relevante investigar se essa relação existe. Dessa forma, o objetivo desse estudo foi comparar a função pulmonar de pacientes cirróticos com ascite, antes e após a realização da paracentese.

Métodos

O presente estudo é caracterizado como descritivo observacional transversal e foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade do Estado de Santa Catarina (CAAE 52887815.6.0000.0118). Todos os pacientes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. Foram recrutados pacientes de ambos os sexos, que realizavam paracentese no ambulatório de Hepatologia do Hospital Universitário Professor Polydoro Ernani de São Thiago, da Universidade do Estado de Santa Catarina, em Florianópolis. Os critérios para inclusão no estudo foram: (1) apresentar diagnóstico clínico de cirrose hepática; (2) realizar paracentese há, pelo menos, dois meses; (3) não ter apresentado infecção respiratória nos últimos seis meses. Os pacientes foram excluídos do estudo quando: (1) apresentaram incapacidade para realizar qualquer uma das avaliações do estudo (falta de compreensão ou de colaboração); ou (2) quando não conseguiram ser avaliados após a paracentese.

Devido todas as alterações sistêmicas, da mecânica respiratória em que os pacientes cirróticos apresentam e da falta de estudos protocolados nessa população, foi realizado um protocolo de avaliação da mecânica e função respiratória e a um teste submáximo [7]. Foram avaliados nove pacientes cirróticos que passaram pôr a avaliação antropométrica, cirtometria abdominal, avaliação dos sinais vitais, avaliação da sensação subjetiva de esforço e prova de função pulmonar antes e após a paracentese. Também antes da paracentese os pacientes foram submetidos à avaliação da capacidade funcional, por meio do teste de caminhada de seis minutos (TC6).

Avaliação antropométrica

Para avaliação antropométrica o paciente apresentou-se vestindo roupas leves e permanecendo com pés descalço durante as aferições de estatura e peso corporal. As medidas foram realizadas pré e após o procedimento de paracentese. Para o peso corporal, o paciente permaneceu sobre uma balança, previamente calibrada, em posição ortostática sem apoio de membros superiores até a estabilização do valor e os registros realizados em quilogramas (kg). Para a estatura, foi utilizado um estadiômetro e o paciente orientado ao posicionamento dos tornozelos paralelos, em postura ortostática, cabeça alinhada e os membros superiores ao longo do corpo para obtenção do valor em metros. Com o registro das medidas foi determinado o índice de massa corporal (IMC) pela equação: massa corporal/estatura2 (kg / m2) e em seguida classificados em baixo peso (IMC < 21 kg / m2), estrófico (IMC 21-25 Kg / m2), sobrepeso (IMC 25 - 30 Kg / m2) e obeso (IMC >30 Kg / m2) [26].

Cirtometria abdominal

Para a mensuração da cirtometria abdominal foram utilizados o ponto médio entre a última costela e a crista ilíaca como pontos anatômicos de referência. Com auxílio de uma fita métrica comum os registros foram realizados em centímetros, sendo considerado ponto de corte de >102 cm no sexo masculino e >88cm no sexo feminino.[26]

Avaliação dos sinais vitais

A avaliação dos sinais vitais foi realizada com o paciente no período de repouso e utilizado o cardiofrequencímetro (Polar® RS800 CX, Kempele, Finlândia) para a frequência cardíaca (FC), o oxímetro de pulso para SpO2 (G-Tech Led), o esfigmomanômetro (G-Tech Digital De Braço – La800) para a pressão arterial (PA), a contagem visual via observação direta da expansão torácica para a frequência respiratória (FR). [26] Além destes, também fora apresentada de percepção de esforço para a avaliação da sensação de dispneia e fadiga de membros inferiores [27].

Prova de função pulmonar

Para a prova de função pulmonar foi utilizado o equipamento digital, portátil, EasyOne (NDD Medical Technologies®, Suíça), e de acordo com as normas do fabricante e realizado conforme os métodos e critérios recomendados pela American Thoracic Society e European Respiratory Society (ATS/ERS) foi calibrado previamente à realização do teste [27]. Por meio da manobra de capacidade vital forçada (CVF) foram registradas as variáveis da função pulmonar, sendo a CVF, volume expirado forçado no primeiro segundo (VEF1) da manobra CVF e a relação VEF1/CVF expressos em valores absolutos e em percentual [29]. Foram realizadas três manobras aceitáveis e duas reprodutíveis. Os critérios de prova pulmonar normal consistiram de CVF e VEF1 ≥ 80% do previsto e VEF1/CVF ≥ 0,7.[28].

Teste de Caminhada de 6 Minutos

A capacidade submáxima de exercício foi avaliada pelo TC6 em ambiente controlado e orientações conforme critérios padronizados pela ATS/ ERS [29]. A PA e a sensação de dispneia e fadiga de membros inferiores (escala de Borg modificada) foram verificadas antes e imediatamente após o TC6. A FC e SpO2 foram monitoradas antes, durante e ao final do teste. Foram realizados dois testes, com intervalo de 30 minutos entre eles ou até que retornassem os valores basais de FC, PA e SpO2 [27]. A maior distância percorrida no TC6 (DTC6) foi utilizada para a análise e a DTC6 predita calculada segundo Britto et al. [30].

Análise estatística

Os dados foram sistematizados no programa SPSS Statistics (Statistical Package for Social Sciences) versão 20.0. Inicialmente adotada estatística descritiva, reportadas em medidas de tendência central (média ou mediana), dispersão (intervalo de confiança de 95% da média ou desvio padrão e frequência absoluta e/ou relativa). As variáveis de idade, sexo, IMC, parâmetros espirométricos, cirtometria abdominal, TC6, volume de retirada de líquido abdominal e tempo de realização de paracentese foram utilizados para caracterização a amostra. Para verificar a normalidade dos dados foi realizado o teste Shapiro Wilk, para comparação da função pulmonar dos pacientes cirróticos com ascite, antes e após a paracentese, foi utilizado o teste de Wilcoxon e para correlação entre as variáveis de volume de retirada pela paracentese e distância percorrida no TC6 o teste de Sperman.

Resultados

Nossa amostra foi composta por aproximadamente 89% (n=8) de indivíduos do sexo masculino, com média de IMC classificado como sobrepeso. Dos nove pacientes, observou-se que seis (66,6%) eram classificados como Child Pugh B. A média do início da realização de paracentese na nossa amostra foi de 19 meses e a distância percorrida no TC6 próximo ao predito da normalidade, conforme apresentado na Tabela 1.

Sexo (M/F)

8/1

Idade (anos)

61,33 ± 6,44

Massa corporal (Kg)

75,73 ± 15,10

Altura (m)

1,67 ± 0,07

IMC

26,87 ± 4,85

TC6 (m)

455,50 ± 4,94

TC6 predito (m)

566,42 ± 17,13

TC6 predito (%)

80,46 ± 3,30

Quantidade de líquido retirada na paracentese (L)

8,50 ± 2,59

Realização de paracentese (meses)

19,77 ±14,21

Variável sexo apresentada em valores absolutos e demais variáveis de caracterização da amostra apresentados em média e desvio padrão. M: sexo masculino; F: sexo feminino; IMC: índice de massa corporal; kg: quilogramas; m: metros; L: Litros.

Tabela 1 – Dados referentes à caracterização da amostra do estudo

Na Tabela 2 são apresentadas as variáveis da função pulmonar nos momentos pré e pós paracentese. É possível observar que não houve diferença estatisticamente significativa entre os valores. Em relação à classificação da função pulmonar, observou-se mudança apenas em 2 pacientes (25%), os quais apresentavam distúrbio restritivo antes da retirada de líquido e foram classificados com função pulmonar normal após o procedimento. Foi observada diferença estatisticamente significativa, antes e após a paracentese, nas variáveis FR (17,55ipm±3,71 vs. 14,88ipm±2,66, p=0,03) e circunferência abdominal (108,4 cm±11,29 vs. 98,60cm±9,63, p=<0,01).

Variáveis

Pré paracentese

Pós paracentese

P

FC (BPM)

68,22 ± 19.93

68,00 ± 18,25

0,67

SpO2 (%)

96,00 ± 3,08

96,22 ± 4,40

0,73

FR (IPM)

17,55 ± 3,71

14,88 ± 2,66

0,03*

Sensação subjetiva de esforço

1,00 ± 1,29

0,16 ± 0,35

0,06

Circunferência abdominal (cm)

108,4 ± 11,29

98,60 ± 9,63

< 0,01*

VEF1/CVF (%)

0,73 ± 0,14

0,74 ± 0,14

0,40

VEF1 (L)

2,45 ± 22,26

2,45 ± 0,85

0,06

VEF1 (%)

66,77 ± 19,01

74,55 ± 22,26

0,69

CVF (L)

2,97 ± 0,84

3,19 ± 0,83

0,13

CVF (%)

70,77 ± 13,67

76,77 ± 15,53

0,18

Variáveis apresentadas em médias e desvio-padrão pré e pós paracentese. FC: frequência cardíaca; SpO2: saturação de pulso de oxigênio; FR: frequência respiratória; VEF1: volume expiratório forçado no primeiro segundo; CVF: capacidade vital forçada; *p<0,05.

Tabela 2 – Comportamento dos sinais vitais, percepção subjetiva de esforço e das variáveis da função pulmonar nos momentos pré e pós paracentese

Com o gráfico de correlação linear apresentado na Figura 1 é possível observar forte correlação entre as variáveis de quantidade de líquido drenado durante a paracentese e a distância percorrida no TC6.

Diagrama, Esquemático

Descrição gerada automaticamente

Fonte: Elaborado pelo Autor, 2023

Figura 1 – Fluxograma de coleta de dados

Discussão

No presente estudo não foi observada diferença estatística na função pulmonar pré e após a realização da paracentese, mesmo com a retirada de alto volume de líquido abdominal (média de ٨,٥٠L). Esse resultado sugere que este procedimento clínico de forma isolada não é capaz de melhorar a função pulmonar de pacientes cirróticos. O acúmulo de líquido na cavidade abdominal, ocasiona desequilíbrio de pressões, elevação diafragmática, prejudicando a mecânica respiratória normal [٢٠,٢٢,٣١].

Estudos apontam a melhora da mecânica respiratória, de variáveis ventilatórias e de mobilidade de caixa torácica com o procedimento da paracentese [6,14,20,32], dados que corroboram com a descrição dos resultados do presente estudo quanto à análise da frequência respiratória, apresentada em 17,55 ±3,71ipm e após 14,88 ±2,66ipm, com diferença estatisticamente significativa dentre os valores (p = 0,03). As alterações restritivas ocasionadas pela ascite levam à diminuição da expansibilidade pulmonar, principalmente em bases [20,32]. Neste estudo, limitam-se as análises quanto ao conforto respiratório gerado após o procedimento, devido à ausência de relatos ou questionários que o refiram. Porém pela diminuição da frequência respiratória tal fato pode ser sugestionado.

Embora não tenha sido apresentada diferença estatisticamente significativa pela função pulmonar quando comparado o momento prévio ao após a paracentese, os valores espirométricos apresentados pelos participantes correspondem à classificação de distúrbios ventilatórios [20,27,33,34]. Pode ser observada a mudança do valor de VEF1, no momento prévio à realização da paracentese corresponde à valores de distúrbio ventilatório moderado (VEF1 66,77% ±19,01) e no momento após evolui para leve (VEF1 74,55% ±22,26), classificados em distúrbio restritivo no momento antes do procedimento e em normal após. O valor de VEF1/CVF apresentou-se inferior à normalidade independente ao período avaliado, onde VEF1/CVF prévio 0,73% (±0,14) e após 0,74% (±0,14), ainda mantendo-se correspondente aos critérios para a classificação de restrição da função pulmonar [34], em soma concluindo o padrão de restritivo dos pacientes avaliados.

Dessa forma, uma explicação possível que justifique a manutenção de distúrbios restritivos após a paracentese nessa população, é que a ascite ocasiona uma alteração permanente no posicionamento do diafragma, levando à redução da sua excursão e mobilidade torácica, dificultando o recrutamento dos alvéolos colapsados [14,20]. Os resultados da frequência respiratória também podem ser justificados pela interferência em seu posicionamento em reflexo do alto volume de líquido intra abdominal, influenciando-o em proporções mecânicas em restrição de sua mobilidade [20], pela elevação de seu posicionamento dentro da cavidade abdominal e diminuição da eficácia de sua contratilidade, tanto pelos fatores já citados, quanto por alterações metabólicas por má nutrição favorecendo à fadiga [16]. Em soma, a retirada do líquido intra abdominal gera o reequilíbrio de pressões intrapulmonares [6,14] reposicionamento diafragmático e, portanto, a diminuição do esforço para respiração.

As alterações pulmonares estão intimamente ligadas à gravidade da doença [20]. A alta incidência do desenvolvimento de ascite após o diagnóstico de cirrose hepática [13] expõe o paciente à deterioração da mecânica respiratória [21] por mecanismos de alteração do tônus vascular, da relação ventilação perfusão (V/Q), ao aumento de shunts-venosos, à fadiga, má nutrição, e ao aumento da mortalidade [2,17,18,22], por isso é tão importante investigar melhor a condição clínica e funcional dos pacientes cirróticos com ascite.

As alterações fisiológicas da doença causam um conjunto disfunções que impactam na qualidade de vida destes pacientes [12]. O decréscimo na função pulmonar terá reflexo na atividade exercida [21], possível de ser demonstrado por avaliação da capacidade funcional, no presente estudo apresentada pelo TC6. No entanto, não foi demonstrado decréscimo relevante ao comparar-se ao predito da normalidade, apresentados 455,50 ±4,94m percorridos, correspondendo à 80,46 ±3,30% do predito, a partir do cálculo do predito conforme utilizado por Britto et al. [30].

Pode-se observar que o benefício à mecânica respiratória não foi unânime dentre os indivíduos que receberam o procedimento, apenas 25% apresentaram evolução na classificação da função pulmonar de leve para normal. Tal fato sugere que a realização da paracentese de forma isolada não é suficiente para o reestabelecimento da normalidade da dinâmica respiratória e sintomatologia gerada na população. O baixo número de amostras no atual estudo não permite o desenvolvimento do poder de análises estatísticas acuradas, porém dentre os poucos pacientes avaliados ocorreram alterações de valores de volumes pulmonares determinantes para o diagnóstico de distúrbios ventilatórios.

Tal fato sugere benefícios na associação de técnicas fisioterapêuticas ao procedimento da paracentese no tratamento de pacientes com ascite abdominal para o reestabelecimento do padrão mecânico pulmonar, na importância de prevenção de acometimentos infecciosos de diminuição de riscos cardiovasculares e inflamação sistêmica, que otimizem a funcionalidade, reduzindo a fadiga, melhorando a capacidade funcional e qualidade de vida [2,11,35,36].

A fisioterapia apresenta uma gama de recursos e técnicas conservadoras que objetivam a reexpansão pulmonar e à prática de exercícios físicos, vindos a complementar ao procedimento invasivo da paracentese. Técnicas convencionais ou com o uso de dispositivos adjuvantes como a ventilação não invasiva, manobras e exercícios respiratórios já apresentam comprovada eficácia no tratamento de distúrbios ventilatórios restritivos [37,38] e à prática de exercícios no programa de reabilitação cardiorrespiratória, buscam a funcionalidade destes pacientes para consequentes benefícios na função hepática, capacidade funcional e na qualidade de vida [38,39,40,41,42,43]. Para tal análise é importante que novos estudos investiguem se existe alteração na mobilidade diafragmática nesta população e que associem as técnicas fisioterapêuticas reexpansivas ao tratamento da paracentese, a fim de compreender melhor as suas repercussões na mecânica respiratória e assim oferecer maiores benefícios à população de pacientes cirróticos com ascite.

Conclusão

O procedimento da paracentese de forma isolada parece não alterar a função pulmonar dos pacientes cirróticos com ascite. Contudo, é necessário que estudos sejam realizados para explorar os reflexos da ascite na função pulmonar em um maior número de pacientes. Além disso, devido a eficácia dos exercícios respiratórios e da ventilação não invasiva no tratamento de distúrbios ventilatórios restritivos [37,38], possivelmente seria benéfica a associação da intervenção fisioterapêutica ao procedimento da paracentese, no tratamento desta população.

Limitações

O presente estudo apresentou amostra pequena podendo não refletir adequadamente a diversidade de respostas ou a variabilidade da condição em estudo. Além disso, a falta e ausência de estudos específicos do método pode limitar a compreensão aprofundada de certas condições, restringindo a base de evidências disponível para orientar práticas clínicas e desenvolver intervenções terapêuticas mais eficazes.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflito de interesse.

Fontes de financiamento

Financiamento próprio.

Contribuição dos autores

Andrielli Inocêncio - escrita do artigo e atualização das referências bibliográficas: Gonçalez JC. Coleta de dados e escrita do artigo: Francisco DS, Mello CL. Coleta de dados: Conceição TMA, Paulin E. Orientação na escrita do projeto e do artigo, treinamento e acompanhamento da coleta de dados: Paulin E.

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