ARTIGO ORIGINAL
Sintomas gastrointestinais, consumo alimentar e desidratação em atletas: uma avaliação durante prática de corrida
Gastrointestinal symptoms, eating and dehydration in athletes: an assessment during endurance training
João Gabriel Insberger Soares1, Emilaine Ferreira dos Santos2, Karla Daniele Varela Kaminski3, Luane Aparecida do Amaral1, Thayna Viencz1, Thaís Biasuz1
1Universidade Estadual do Centro Oeste (UNICENTRO), Guarapuava, PR, Brasil
2Centro Universitário Campo Real, Guarapuava, PR, Brasil
3Academia Varela Sports, Guarapuava, PR, Brasil
Recebido em: 6 de Junho de 2025; Aceito em: 12 de Junho de 2025
Correspondência: Thaís Biasuz, thaisbiasuz@unicentro.br
Como citar
Soares JGI, Santos EF, Kaminski KDV, Amaral LA, Viencz T, Biasuz T. Sintomas gastrointestinais, consumo alimentar e desidratação em atletas: uma avaliação durante prática de corrida. Nutr Bras. 2025;24(2):1423-1439. doi:10.62827/nb.v24i2.3062
Introdução: A corrida é reconhecida por seus benefícios à saúde física e mental. Entretanto, podem surgir complicações, como sintomas gastrointestinais, desidratação e inadequações alimentares. Objetivo: Analisou-se os efeitos adversos da prática de corrida e o consumo alimentar de corredores do município de Guarapuava-PR. Métodos: Dados sociodemográficos, prática esportiva e consumo alimentar foram coletados por questionários e diários alimentares das 24 horas anteriores à corrida de 18 atletas de corrida de rua. Os sintomas gastrointestinais foram avaliados pela Escala de Sintomas Gastrointestinais (GSRS), e o peso foi aferido pós-corrida. Análises estatísticas incluíram ANOVA, teste de Tukey e correlação point-bisserial (p < 0,05). Resultados: Os participantes mantiveram o estado de hidratação, com um caso de desidratação mínima. O grupo com menor tempo de prática apresentou maior número de sintomas gastrointestinais. Correlações indicam que tanto a ingestão ao longo das 24 horas anteriores à prova quanto à refeição pré-corrida desempenha papéis importantes na manifestação desses desconfortos, sendo identificadas associações significativas entre o consumo de carboidratos, proteínas e lipídios com sintomas como refluxo gastroesofágico, vômito, diarreia e flatulência. Conclusão: Resultados mostraram maior participação feminina na prática de corrida, os sintomas gastrointestinais foram mais frequentes no grupo menos experiente, e o consumo pré-corrida de carboidratos e proteínas correlacionou-se com desconfortos gastrointestinais. Estratégias alimentares adequadas são essenciais para minimizar esses sintomas e otimizar a prática esportiva.
Palavras-chave: Treino Aeróbico; Desidratação; Ingestão de Alimentos; Sinais e Sintomas Digestórios.
Introduction: Running is recognized for its benefits to physical and mental health. However, complications such as gastrointestinal symptoms, dehydration, and dietary inadequacies may arise. Objective: The adverse effects of running and dietary intake among runners from the city of Guarapuava-PR were analyzed. Methods: Sociodemographic data, sports practice, and dietary intake were collected using questionnaires and food diaries from the 24 hours preceding the race of 18 street runners. Gastrointestinal symptoms were evaluated using the Gastrointestinal Symptom Rating Scale (GSRS), and weight was measured post-run. Statistical analyses included ANOVA, Tukey’s test, and point-biserial correlation (p < 0.05). Results: Participants maintained hydration status, with one case of minimal dehydration. The group with less practice time reported more gastrointestinal symptoms. Correlations indicate that both food intake during the 24 hours before the race and pre-race meals play key roles in these discomforts, with significant associations identified between carbohydrate, protein, and lipid intake and symptoms such as gastroesophageal reflux, vomiting, diarrhea, and flatulence. Conclusion: Results showed higher female participation in running, more frequent gastrointestinal symptoms in the less experienced group, and a correlation between pre-race carbohydrate and protein intake and gastrointestinal discomforts. Appropriate dietary strategies are essential to minimize these symptoms and optimize sports performance.
Keywords: Endurance Training; Dehydration; Eating; Signs and Symptoms.
A corrida, uma das atividades físicas mais acessíveis e populares, conquistou um lugar de destaque no cenário esportivo global. Milhões de pessoas, de diferentes idades e níveis de condicionamento físico, praticam essa atividade regularmente, atraídas pelos seus consideráveis benefícios à saúde física e mental e à qualidade de vida. No entanto, à medida que mais pessoas se envolvem nessa atividade, surgem preocupações sobre os possíveis efeitos adversos que podem acompanhar a atividade física intensa. Entre esses efeitos, problemas gastrointestinais, inadequação da alimentação e desidratação surgem como questões importantes que merecem uma investigação detalhada [1].
Os sintomas gastrointestinais durante o exercício são uma preocupação significativa para muitos atletas, variando de distúrbios leves, como desconforto abdominal e flatulência, até problemas mais graves, como náuseas, vômitos e diarreia. Esses sintomas afetam o desempenho esportivo, o condicionamento físico do atleta e sua saúde geral [2].
A etiologia dessas condições é considerada multifatorial, incluindo a possibilidade de patologias subjacentes e às adaptações fisiológicas decorrentes do exercício (diminuição no fluxo sanguíneo esplâncnico, alterações na digestão e trânsito intestinal) e aumento da permeabilidade intestinal. Diversos fatores como a modalidade, duração e intensidade do exercício, idade do atleta, ingestão alimentar antes e durante o treino e estado de desidratação, podem potencializar tais sintomas [3,4].
Outro fator importante durante a prática esportiva é a manutenção da hidratação do atleta. A hidratação adequada desempenha um papel fundamental para o organismo, pois regula a temperatura corporal, transporta nutrientes e oxigênio para as células, elimina resíduos metabólicos e mantém a função cardiovascular [5]. A desidratação, por outro lado, desencadeia uma série de efeitos estressantes, como fadiga, redução do desempenho atlético, aumento do risco de lesões, elevação da frequência cardíaca, queda da pressão arterial, aumento da temperatura corporal, aumento do estresse metabólico e maior propensão a doenças relacionadas à desidratação [6].
A desidratação de 1 a 2% do peso corporal começa a comprometer a função fisiológica e influência negativamente o desempenho. A desidratação de mais de 3 a 5% do peso corporal perturba ainda mais a função fisiológica e aumento de risco de um atleta desenvolver condições relacionadas ao calor, como cãibras, exaustão pelo calor ou insolação [7,8].
Faz-se necessário que os atletas mantenham um estado de hidratação adequado antes, durante e após o exercício, a fim de melhorar seu desempenho atlético e minimizar o risco de lesões e sintomas pós-corrida. Reconhecer os sintomas iniciais da desidratação, como sede, irritabilidade, mal-estar geral, dores de cabeça, fraqueza, tontura, cãibras, calafrios, vômitos, náuseas, sensações de calor na cabeça ou no pescoço e redução do desempenho, é fundamental para uma intervenção precoce e uma prática esportiva segura e eficaz [7,9,10].
Investigou-se os efeitos adversos da prática de corrida e o consumo alimentar de corredores no município de Guarapuava – Paraná.
Este estudo foi conduzido como uma pesquisa de campo de abordagem mista (qualitativa e quantitativa) e de delineamento transversal. Seguiu rigorosamente os critérios éticos da Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde e foi iniciado após a aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Estadual do Centro Oeste (CAAE n° 76876823.0.0000.0106).
A população-alvo do estudo consistiu em corredores de rua, residentes em Guarapuava, Paraná, que treinavam regularmente, com frequência mínima de uma vez por semana. Os participantes foram abordados durante visitas a centros de treinamento, onde foram convidados a integrar o estudo. Os critérios de inclusão exigiam que os indivíduos residissem em Guarapuava, maiores de 18 anos de idade e que realizassem treinamentos regulares de corrida. Não houve restrição quanto à faixa etária para participação no estudo. Os critérios de exclusão incluíram a presença de patologias gastrointestinais como Síndrome do Intestino Irritável, Doença de Crohn e Doença Celíaca, bem como o uso de medicamentos diuréticos, antieméticos ou antiácidos.
Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), conforme as normas das resoluções 466/12, assegurando a voluntariedade e esclarecendo os objetivos e procedimentos da pesquisa.
Os dados sociodemográficos (data de nascimento, idade, sexo, escolaridade, renda e profissão), assim como informações sobre a experiência com corrida e níveis de treinamento, além da prática de outros esportes, foram coletados por meio de questionário. O consumo alimentar e hídrico foi registrado por meio de diários alimentares, nos quais os participantes descreveram os alimentos e bebidas consumidos nas 24 horas anteriores à corrida. Para auxiliar no preenchimento, foi enviado, via aplicativo de mensagens, um material gráfico com ilustrações de porções utilizando utensílios domésticos. O material gráfico foi adaptado de acordo com Castro [11], este manual fornece informações essenciais para a crítica de inquéritos alimentares, com foco na padronização de medidas caseiras. Inclui referências bibliográficas, equivalências de medidas e adaptações para alimentos ou preparações sem padronizações estabelecidas. A coleta de dados para análise da taxa de desidratação e de sintomas gastrointestinais foi realizada pré e pós-corrida, realizada no dia 04 de agosto de 2024. A prova de corrida foi realizada no período matutino, às 09:00 horas e o percurso percorrido foi de 5 km para todos os participantes do estudo e tratava-se de uma competição local.
A avaliação da taxa de desidratação durante a prova seguiu o método de Casa et al. [7], baseado na variação do peso corporal dos participantes. Eles foram pesados antes e após a corrida em uma balança digital (G-tech, modelo Glass 10) e, para maior precisão, esvaziaram a bexiga antes da pesagem inicial. Durante a prova, cada corredor recebeu 200 mL de água mineral e foi orientado a consumir apenas essa quantidade. Após a corrida, foram pesados novamente antes de urinar. Aqueles que urinaram ou ingeriram alimentos antes da pesagem final foram excluídos da análise. O cálculo de desidratação utilizou a perda e o percentual de alteração de peso, sendo considerados bem hidratados aqueles com até 1% de variação no peso corporal [7].
Os participantes foram submetidos a uma avaliação dos sintomas gastrointestinais por meio de um questionário adaptado da Escala de Avaliação de Sintomas Gastrointestinais (GSRS) [3]. O questionário abordou os seguintes sintomas: náusea, vômito, refluxo gastroesofágico, pirose, dor epigástrica, eructação, sensação de vazio no estômago, dor abdominal, urgência fecal, diarreia, flatulência e distensão abdominal. Os participantes classificaram a intensidade dos sintomas em uma escala Likert de sete pontos (1 = ausente; 2 = leve; 3 = leve; 4 = moderado; 5 = moderadamente grave; 6 = grave; 7 = muito grave). Para a análise, uma pontuação de ≥ 2 indicou a presença de sintomas, e uma pontuação de ≥ 4 indicou sintomas de intensidade moderada. O questionário foi aplicado presencialmente após a corrida e realizado a aferição do peso pós-corrida.
Os dados de consumo alimentar foram analisados com o software Avanutri® (versão Online), com obtenção da ingestão de macronutrientes e micronutrientes pelos participantes. Os dados de caracterização, dados sociodemográficos e de prática esportiva, foram tabulados e apresentados quanto suas distribuições de frequências absolutas (n) e relativas (%). Os participantes foram divididos em grupos de acordo com o condicionamento físico, observados pelo tempo de prática de corrida. Para variáveis quantitativas utilizou-se a Análise de variância (ANOVA), seguida pelo teste de Tukey, considerando a normalidade de distribuição dos dados verificada pelo teste de Shapiro-Wilk, assumindo-se significância estatística (p < 0,05). As correlações entre consumo alimentar e presença/ausência de sintomas gastrointestinais foi realizada pelo teste de correlação point-bisserial, utilizando de pacote estatístico do Minitab 22.1.0.
Participaram do estudo 18 corredores com idade entre 18 e 65 anos, com média de idade de 41,22 (±12,4) anos. Entre os participantes, 66,67% (n=12) eram do sexo feminino e 33,33% (n=5) do sexo masculino. Os participantes foram divididos em 3 grupos, de acordo com tempo que praticam o esporte: Grupo 1 (mais de 5 anos) com 7 corredores (38,89%), Grupo 2 (entre 2 até 5 anos) com 5 participantes (27,78%) e Grupo 3 (6 meses até 2 anos) com 6 participantes (33,33%). Na Tabela 1 são apresentadas as informações de escolaridade e renda dos participantes e suas experiências com a prática esportiva.
Quanto à escolaridade e renda familiar, os resultados variaram entre ensino fundamental completo e pós-graduação, e rendas de até um salário-mínimo a mais de cinco salários-mínimos.
Em relação à frequência de corrida, os grupos apresentaram diferenças na frequência de corrida semanal. No Grupo 1, a maioria (42,86%) praticava entre 1 e 2 vezes por semana, enquanto uma parcela menor praticava diariamente (14,29%). No Grupo 2, 60% treinavam entre 1 e 2 vezes, e 40% entre 3 e 4 vezes. No Grupo 3, 50% corriam de 1 e 2 vezes por semana, 33,33% entre 3 e 4 vezes, e 16,67% diariamente. No que diz respeito à distância percorrida, a maioria dos participantes percorrem entre 5 e 10 km, sendo todos os participantes do grupo 2, 83,33% dos participantes do grupo 3 e 57,13% do grupo 1. No Grupo 3, um participante relatou correr de forma rotineira menos de 5 km, ou seja, distância menor do que a prova executada.
Tabela 1 - Dados sociodemográficos e experiência esportiva
|
Variável |
Grupo 1 n (%) |
Grupo 2 n (%) |
Grupo 3 n (%) |
|
Escolaridade |
|||
|
Pós-graduação |
4 (57,14) |
2 (40,00) |
2 (33,33) |
|
Superior completo |
0 (0) |
0 (0) |
1 (16,66) |
|
Ensino médio completo |
3 (42,56) |
2 (40,00) |
3 (50,00) |
|
Ensino fundamental completo |
0 (0) |
1 (20,00) |
0 (0) |
|
Renda |
|||
|
Menos de 1 salário-mínimo |
0 (0) |
0 (0) |
1 (16,66) |
|
1 a 2 salários-mínimos |
0 (0) |
2 (40,00) |
1 (16,66) |
|
2 a 3 salários-mínimos |
4 (57,14) |
1 (20,00) |
1 (16,66) |
|
3 a 4 salários-mínimos |
1 (14,28) |
0 (0) |
0 (0) |
|
4 a 5 salários-mínimos |
0 (0) |
1 (20,00) |
1 (16,66) |
|
Mais de 5 salários-mínimos |
2 (28,57) |
0 (0) |
2 (33,33) |
|
Preferiu não responder |
0 (0) |
1 (20,00) |
0 (0) |
|
Frequência de corrida |
|||
|
Diariamente |
1 (14,29) |
0 (0) |
1 (16,67) |
|
3 a 4 vezes na semana |
2 (28,57) |
2 (20) |
2 (33,33) |
|
1 a 2 vezes na semana |
3 (42,86) |
3 (60) |
3 (50) |
|
Menos de uma vez por semana |
1 (14,29) |
2 (20) |
0 (0) |
|
Distância que percorre |
|||
|
Mais de 15 km |
1 (14,29) |
0 (0) |
0 (0) |
|
Entre 10 e 15 km |
1 (14,29) |
0 (0) |
0 (0) |
|
Entre 5 e 10 km |
4 (57,13) |
5 (100) |
5 (83,33) |
|
Menos de 5 km |
1 (14,29) |
0 (0) |
1 (16,67) |
|
Participa regularmente de competições? |
|||
|
Sim |
7 (100) |
5 (100) |
5 (83,33) |
|
Não |
0 (0) |
0 (0) |
1 (16,67) |
|
Tipo de competições |
|||
|
Locais |
7 (100) |
5 (100) |
6 (100) |
|
Regionais |
3 (42,85) |
3 (60) |
3 (50) |
|
Nacionais |
2 (28,57) |
1 (20) |
0 (0) |
|
Número de competições no último ano |
|||
|
7 ou mais |
3 (42,85) |
1 (20) |
3 (50) |
|
Entre 4 e 6 |
3 (42,85) |
2 (40) |
2 (33,33) |
|
Entre 1 e 3 |
1 (14,30) |
2 (40) |
1 (16,67) |
|
Realiza acompanhamento profissional |
|||
|
Sim |
3 (42,86) |
4 (80) |
5 (83,33) |
|
Não |
4 (57,14) |
1 (20) |
1 (16,67) |
|
Prática outras modalidades esportivas |
|||
|
Sim |
5 (71,43) |
4 (80) |
6 (100) |
|
Não |
2 (28,57) |
1 (20) |
0 (0) |
O hábito de participar de competições foi alto em todos os grupos, com 100% dos corredores do Grupo 1 e do Grupo 2 e 83,33% do Grupo 3 envolvidos regularmente em competições. Majoritariamente, foram relatadas participações em eventos locais, enquanto alguns também participavam de competições regionais, 57,14% (n=4) no grupo 1, 60% (n=3) no grupo 2 e 50% (n=3) no grupo. A participação em competições nacionais foi relatada no grupo 1 com 28,57% (n=2) e no grupo 2 em 20% (n=1).
No último ano, o número de competições variou entre 1 e 3 e mais de 7 competições anuais, com o Grupo 1 registrando o maior percentual de corredores que competiram sete ou mais vezes. Além disso, o acompanhamento profissional mostrou-se predominante entre os grupos, especialmente no Grupo 3, onde 83,33% relataram suporte de preparadores físicos, nutricionistas, fisioterapeutas e médicos.
A prática de outras modalidades esportivas variou entre os grupos. No Grupo 1, 71,43% dos participantes realizavam atividades adicionais (musculação, muay thai, calistenia, atletismo, ciclismo, natação e funcional), enquanto 28,57% (n=2) não praticavam. No Grupo 2, 80% dos participantes praticavam outras modalidades (natação, musculação, paraquedismo, ciclismo), enquanto 20% (n=1) não praticavam. No Grupo 3, todos os participantes (100%) relataram envolvimento em atividades complementares, incluindo musculação, muay thai, atletismo, futebol, ciclismo e natação.
A tabela 2 aponta os resultados quanto à ocorrência de sintomas gastrointestinais. A presença de sintomas foi relatada nos grupos 1 e 3, enquanto os participantes do grupo 2 não apresentaram sintomas.
No grupo 1, foram observadas uma ocorrência de náusea leve entre os sintomas gastrointestinais superiores e, entre os sintomas inferiores, duas ocorrências de dor abdominal leve e distensão abdominal leve.
Tabela 2 - Ocorrência de sintomas gastrointestinais em praticantes de corrida durante a prova
|
Sintomas |
Grupo 1* |
Intensidade |
Grupo 2* |
Intensidade |
Grupo 3* |
Intensidade |
|
Superiores |
||||||
|
Refluxo |
0 |
A |
0 |
A |
2 |
L |
|
Pirose |
0 |
A |
0 |
A |
0 |
A |
|
Eructação |
0 |
A |
0 |
A |
0 |
A |
|
Dor epigástrica |
0 |
A |
0 |
A |
1 |
L |
|
Náusea |
1 |
L |
0 |
A |
2 |
L |
|
Vômito |
0 |
A |
0 |
A |
1 |
L |
|
Sensação de vazio |
0 |
A |
0 |
A |
2 |
L |
|
Inferiores |
||||||
|
Dor abdominal |
2 |
L |
0 |
A |
1 |
L |
|
Distensão abdominal |
1 |
L |
0 |
A |
1 |
M |
|
Flatulência |
0 |
A |
0 |
A |
1 |
L |
|
Urgência fecal |
0 |
A |
0 |
A |
1 |
M |
|
Diarreia |
0 |
A |
0 |
A |
1 |
|
Nota: *Número de Ocorrências dos sintomas; Intensidade = A (Ausente); L (Leve); M (Moderado); G (Grave).
No grupo 3, observou-se uma maior diversidade de sintomas. Entre os sintomas gastrointestinais superiores, registraram-se duas ocorrências de refluxo leve e uma dor epigástrica leve. Entre os sintomas inferiores, foram observadas ocorrências de dor abdominal leve, distensão abdominal moderada, flatulência leve, urgência fecal moderada e diarreia leve, sendo os três últimos sintomas observados somente no Grupo 3.
Apenas um corredor apresentou desidratação mínima, com uma perda de peso correspondente a 1,2% do peso corporal, totalizando 700 g de perda de peso corporal. Os demais corredores apresentaram uma média de perda de peso de aproximadamente 300 g, a média dos percentuais de alteração de peso entre os participantes foi de aproximadamente 0,46%, indicando boa hidratação, sem alcançar nenhuma classificação de desidratação.
A análise do consumo calórico e distribuição de macronutrientes nas refeições de 24h e refeição que antecederam a prova de corrida, estão apresentadas na tabela 3.
Tabela 3 – Análise do consumo calórico e distribuição de macronutrientes nas refeições de 24h e refeição que antecederam a prova de corrida
|
Variáveis de consumo |
Grupo 1 (Média±DP) |
Grupo 2 (Média±DP) |
Grupo 3 (Média±DP) |
p* |
|
Kcal total (R24h) |
1979,26±755,11 |
1902,29±557,75 |
2658,56±968,66 |
0,374 |
|
Mínimo e máximo (kcal) |
1069,95-3121,14 |
1374,85-2630,90 |
1560,81-3794,29 |
|
|
Carboidrato total (g/kg) |
3,01±1,17 |
3,08±1,54 |
4,45±1,94 |
0,230 |
|
Proteína total (g/kg) |
1,27±0,55 |
1,409±0,22 |
1,61±0,82 |
0,607 |
|
Lipídeo total (g/kg) |
1,10±0,48 |
0,88±0,515 |
1,46±0,92 |
0,377 |
|
Fibra total (g) |
18,31±10,66 |
27,86±10,58 |
24,00±10,96 |
0,328 |
|
Kcal Pré-Corrida |
293,90±207,30 |
408,44±192,00 |
336,34±358,41 |
0,653 |
|
Mínimo e máximo |
134,30-714,20 |
145,75-642,06 |
57,84-957,63 |
|
|
Carboidrato Pré-Corrida (g) |
30,36±16,73 |
49,18±17,78 |
55,48±58,73 |
0,258 |
|
Proteína Pré-Corrida (g) |
10,96±8,86 |
17,16±12,43 |
12,76±17,11 |
0,672 |
|
Lipídeo Pré-Corrida (g) |
14,29±12,38 |
15,89±12,98 |
7,28±9,90 |
0,461 |
Nota: *Análise de variância (p<0,05). Mínimo e máximo de consumo calculados individualmente por meio do software Avanutri®. Valores expressos em média e desvio padrão.
A distribuição de quilocalorias (Kcal) e macronutrientes consumidos em 24 horas e na refeição que antecedeu a prova, não apresentou diferenças estatisticamente significativas nas variáveis de consumo entre os grupos (p>0,05).
A análise de correlação point-biserial entre variáveis de consumo alimentar e a presença de sintomas gastrointestinais (Tabela 4 e 5) demonstrou correlações significativas entre a ingestão energética e de macronutrientes com o surgimento de desconfortos gastrointestinais em corredores. Observou-se que a ingestão total de calorias, ao longo de 24 horas, apresentou correlação positiva significativa com sintomas como vômito (r= 0,53, p= 0,029), refluxo gastroesofágico (r= 0,64, p= 0,006), dor epigástrica (r= 0,53, p= 0,029), sensação de vazio no estômago (r = 0,64, p = 0,006), urgência fecal (r= 0,53, p= 0,029), diarreia (r= 0,53, p= 0,029) e flatulência (r= 0,53, p= 0,029).
Tabela 4 - Correlações entre variáveis de consumo alimentar de 24 horas e a presença de sintomas gastrointestinais
|
Variáveis |
Kcal Correlação (IC de 95%) |
Carboidrato Correlação (IC de 95%) |
Proteína Correlação (IC de 95%) |
Lipídeo Correlação (IC de 95%) |
Fibra Correlação (IC de 95%) |
|
Náusea |
-0,07 (-0,53;0,42) |
0,12 (-0,37;0,57) |
-0,46 (-0,76;0,01) |
0,003 (-0,46;0,47) |
-0,44 (-0,75;0,04) |
|
Vômito |
0,53* (0,06;0,81) |
0,28 (-0,23;0,67) |
0,54* (0,10;0,81) |
0,54* (0,09;0,80) |
0,25 (-0,25;0,64) |
|
Refluxo |
0,64* (0,23;0,86) |
0,55* (0,09;0,82) |
0,42 (-0,06;0,74) |
0,55* (0,11; 0,81) |
0,45 (-0,02;0,76) |
|
Dor epigástrica |
0,53* (0,06;0,81) |
0,28 (-0,23;0,67) |
0,54* (0,10;0,81) |
0,54* (0,09;0,80) |
0,25 (-0,25;0,64) |
|
Sensação de Vazio |
0,64* (0,23;0,86) |
0,55* (0,09;0,82) |
0,42 (0,06;0,74) |
0,55* (0,11; 0,81) |
0,45 (-0,02;0,76) |
|
Dor abdominal |
0,33 (-0,19;0,69) |
0,27 (-0,25;0,66) |
0,44 (-0,04;0,75) |
0,25 (-0,24;0,64) |
0,04 (-0,43;0,50) |
|
Urgência fecal |
0,53* (0,06;0,81) |
0,28 (-0,23;0,67) |
0,54* (0,10;0,81) |
0,54* (0,09;0,80) |
0,25 (-0,25;0,64) |
|
Diarreia |
0,53* (0,06;0,81) |
0,28 (-0,23;0,67) |
0,54* (0,10;0,81) |
0,54* (0,09;0,80) |
0,25 (-0,25;0,64) |
|
Flatulência |
0,53* (0,06;0,81) |
0,28 (-0,23;0,67) |
0,54* (0,10;0,81) |
0,54* (0,09;0,80) |
0,25 (-0,25;0,64) |
|
Distensão |
0,13 (-0,37;0,58) |
-0,03 (-0,51;0,45) |
0,35 (-0,14;0,70) |
0,20 (-0,29;0,61) |
-0,04 (-0,49;0,46) |
Nota: * = valor de p<0,05, correlações significativas.
O consumo de carboidratos total correlacionou-se positivamente com a ocorrência de refluxo gastroesofágico (r= 0,55, p= 0,021) e a sensação de vazio no estômago (r= 0,55, p= 0,021), indicando que o aumento na ingestão desse macronutriente pode exacerbar esses sintomas. Da mesma forma, a ingestão de proteínas mostrou correlações positivas com a ocorrência de sintomas como vômito, dor epigástrica, urgência fecal, diarreia e flatulência (r= 0,54, p= 0,020 para todos os sintomas mencionados).
Em relação à ingestão de lipídios, os resultados indicam correlações positivas significativas, incluindo vômito, refluxo gastroesofágico, dor epigástrica, sensação de vazio no estômago, urgência fecal, diarreia e flatulência (r variando de 0,54 a 0,55, p ≈ 0,021). O consumo calórico e de macronutrientes na refeição pré-corrida também apresentou correlações significativas com a presença de sintomas gastrointestinais.
Tabela 5 - Correlações entre variáveis de consumo alimentar da refeição pré-corrida e a presença de sintomas gastrointestinais
|
Variáveis |
Kcal Correlação (IC de 95%) |
Carboidrato Correlação (IC de 95%) |
Proteína Correlação (IC de 95%) |
Lipídeo Correlação (IC de 95%) |
|
Náusea |
-0,23 (-0,64;0,28) |
-0,11 (-0,57;0,41) |
-0,31 (-0,69;0,19) |
-0,34 (-0,70;0,17) |
|
Vômito |
0,65* (0,24;0,86) |
0,82** (0,54;0,94) |
0,63* (0,22;0,85) |
0,26 (-0,25;0,66) |
|
Refluxo |
0,26 (-0,25;0,66) |
0,39 (-0,13;0,74) |
0,31 (-0,20;0,69) |
0,009 (-0,47; 0,48) |
|
Dor epigástrica |
0,65* (0,24;0,86) |
0,82** (0,54;0,94) |
0,63* (0,22;0,85) |
0,26 (-0,25;0,66) |
|
Sensação de Vazio |
0,26 (-0,25;0,66) |
0,39 (-0,13;0,74) |
0,31 (-0,20;0,69) |
0,009 (-0,47; 0,48) |
|
Dor abdominal |
0,51* (0,04;0,79) |
0,48 (-0,01;0,79) |
0,44 (-0,04;0,76) |
0,43 (-0,06;0,75) |
|
Urgência fecal |
0,65* (0,24;0,86) |
0,82** (0,54;0,94) |
0,63* (0,22;0,85) |
0,26 (-0,25;0,66) |
|
Diarreia |
0,65* (0,24;0,86) |
0,82** (0,54;0,94) |
0,63* (0,22;0,85) |
0,26 (-0,25;0,66) |
|
Flatulência |
0,65* (0,24;0,86) |
0,82** (0,54;0,94) |
0,63* (0,22;0,85) |
0,26 (-0,25;0,66) |
|
Distensão |
0,31 (-0,19;0,69) |
0,42 (-0,09;0,75) |
0,35 (-0,15;0,71) |
0,09 (-0,40;0,55) |
Nota: * = valor de p<0,05, correlações significativas. ** = valor de p <0,001.
A ingestão calórica antes da corrida mostrou uma correlação significativa com vômito, dor epigástrica, urgência fecal, diarreia e flatulência (r= 0,65, p= 0,005). O consumo de carboidratos e proteínas pré-corrida mostrou uma alta correlação com a presença de sintomas gastrointestinais, incluindo vômito, dor epigástrica, urgência fecal, diarreia e flatulência (r= 0,82, p < 0,001 para carboidratos e r= 0,63, p= 0,006 para proteínas).
Os resultados demonstraram que os participantes mantiveram o estado de hidratação ao final da prova, com somente uma ocorrência de desidratação mínima. Observou-se um maior número de ocorrências de sintomas gastrointestinais no grupo 3, composto por participantes com menor tempo de prática esportiva.
Sobre os dados demográficos, experiência esportiva e nível hidratação alguns estudiosos buscaram conhecer tais dados, como Ferreira et al. [12], ao avaliar corredores de rua de Feira de Santana – BA participantes de provas de 10 km, obtendo uma amostra de 20 participantes que frequentavam um grupo de corrida local, na categoria amador. Os participantes eram de ambos os sexos, com idade média entre 39 anos, faixa etária semelhante ao encontrado nesta pesquisa. Diferentemente, no presente estudo a prevalência foi para corrida entre 1 a 2 vezes na semana, nos três grupos estudados, porém cabe destacar uma incidência da prática de outras modalidades esportivas realizadas pelos participantes.
O perfil socioeconômico também foi avaliado por Cardoso et al. [13] com 155 praticantes de corrida de rua da cidade de Teresina, foi verificada uma maior prevalência de participação do sexo masculino contando com 87 homens (56,1%), e 68 mulheres (43,9%) com idade variando entre 31 e 40 anos, com tempo de prática da atividade entre 1 a 3 anos.
Antonio e Laux [14] relatam em seu estudo uma maior participação do público feminino (55,60%), diferentemente dos achados em outros estudos em que encontraram uma maior prevalência de homens corredores. Ainda, o nível de escolaridade mais prevalente encontrado pelos autores foi de pós-graduação. Os resultados são semelhantes aos achados neste estudo, com prevalência de corredoras mulheres e com escolaridade prevalente de pós-graduação e ensino médio completo.
O estado de desidratação verificado neste trabalho demonstrou que os participantes apresentaram algum nível de desidratação através de uma discreta perda de peso, porém não gerando uma classificação de desidratação. Essas alterações também foram observadas por Ribeiro [15] que objetivou analisar o estado de hidratação de corredores de rua em provas de 10 km com e sem acesso a água numa amostra de 30 homens com idade entre 30 a 50 anos, detectando que a oferta de água durante a prova mostrou-se válida para a manutenção dos níveis de hidratação. Cabe ainda ressaltar, que ao comparar os níveis de hidratação em corredores com e sem acesso a líquidos, há um grau de desidratação maior na segunda opção, ele ainda descreve que todos os participantes eram corredores experientes e que tal fator pode ter influenciado na perda controlada de líquidos, pois o grupo pode apresentar uma alta eficiência mecânica e um sistema termorregulador eficiente.
Sobre o estado ideal de hidratação antes do exercício, não há um consenso universal de um nível ideal, nem um parâmetro de desidratação que possa ser utilizado para comparar entre os atletas [16], portanto muitos estudos utilizam outros parâmetros para verificar o nível de hidratação como o exame de urina e a perda de peso após a corrida, parâmetro utilizado no estudo. Compete evidenciar, que a avaliação da perda de peso será correspondente ao momento da corrida, não identificando estados de desidratação previamente estabelecidos, ou seja, muitos participantes podem iniciar a prova em estado desidratação.
Quanto ao consumo de altas quantidades de alimentos antes e durante a competição, os estudos relatam que tal comportamento atrasa o esvaziamento gástrico e interferem na execução da digestão, além de alterar a deslocação de água para o lúmen intestinal. Entre as fontes alimentares que induzem a tal mecanismo encontra-se alimentos ricos em gordura, proteína, frutose, fibra e FODMAPs (Oligossacarídeos fermentáveis, dissacarídeos, monossacarídeos e poliós), ainda é importante enfatizar que eles têm potencial para induzir alterações gastrointestinais que interfiram no rendimento do corredor [17].
Já para Lira et al. [18], é provável que tais sintomas, durante a realização da corrida, sejam resultantes de alterações diversas e multifatoriais que variam de acordo com a individualidade. A análise do impacto da realização do exercício sobre o trato gastrointestinal deve ocorrer de forma a possibilitar a adoção de uma abordagem global, ou seja, considerando diversos fatores. Destaca-se que a ocorrência de sintomas gastrointestinais observadas nesse estudo, foram mais prevalentes no grupo 3, no qual a experiência com a corrida está entre 6 meses e 2 anos.
Os achados na análise de correlação sugerem que uma maior ingestão calórica diária e na refeição pré-corrida pode estar associada a uma maior frequência de sintomas gastrointestinais em atividades de corrida. Esses achados indicam que o consumo energético elevado pode exercer um impacto no trato gastrointestinal dos corredores. O consumo elevado de lipídios no dia que antecede as provas de corrida pode estar associado a uma maior incidência de desconfortos gastrointestinais superiores e inferiores, o que pode estar relacionado com a maior dificuldade de digestão das gorduras e o esvaziamento gástrico [19].
Os resultados obtidos neste estudo indicam que a escolha da fonte e a quantidade de macronutrientes consumidos antes da corrida podem ser determinantes na manifestação de sintomas gastrointestinais durante o exercício, apontando para a importância de ajustar a ingestão alimentar de acordo com a tolerância individual para minimizar o desconforto. O consumo adequado de carboidratos pode contribuir para performance durante a corrida, no entanto, Sessions et al. [20] relatam que o consumo de carboidratos combinado ao estresse físico induzido pelo exercício físico, pode contribuir para aumento dos sintomas gastrointestinais.
A ingestão proteica elevada pode contribuir para o aumento da sensibilidade gastrointestinal, possivelmente por conta do tempo e complexidade de digestão deste macronutriente [21]. Sobre a ingestão alimentar de atletas, na refeição pré-exercício e a manifestação de sintomas gástricos, Medeiros et al. [19], observaram que os participantes apresentaram inadequação do consumo de carboidrato e maior consumo de proteínas, relação que se apresenta como gênese do surgimento de desconforto gástrico e físico durante o treinamento.
O consumo de carboidratos e proteínas de 24 horas e refeição antes da competição, foram correlacionados a manifestação de sintomas. Porém, na refeição que antecede a prova, foi possível observar uma forte correlação desses macronutrientes e o surgimentos dos sintomas vômito, dor epigástrica, urgência fecal, diarreia e flatulência, indicando essa refeição como fator determinante.
Assim, a relação entre a realização do exercício e alterações gastrointestinais é um assunto pouco estudado, todavia tem potencial para desencadear o surgimento de vômitos, náuseas e pirose retroesternal, assim como manifestar quadros de diarreia, cólica abdominal, perda de apetite, sangramento, aceleração dos movimentos intestinais e vontade de defecar. Tais sintomas possuem etiologia multifatorial e envolve a diminuição do fluxo sanguíneo intestinal, assim como a liberação de hormônios gástricos, o estresse mecânico causado pelo exercício, além de desidratação, alterações psicológicas, idade, sexo e o tipo de dieta [19].
O grupo 1 e 3 deste estudo manifestaram sintomas gastrointestinais, todavia, o grupo 3 apresentou uma variedade maior de sintomas, os achados demonstraram correlações significativas entre a ingestão energética e de macronutrientes com o surgimento desses desconfortos gastrointestinais. Contando com a manifestação de sintomas como o surgimento de vômito, dor epigástrica, urgência fecal, diarreia e flatulência.
Então, segundo Carvalho [22] a seleção dos alimentos fonte de carboidratos e a preparação das refeições anteriores aos eventos esportivos devem considerar as características gastrointestinais do atleta, assim como o tamanho da refeição e a composição de proteínas e fibras, já que podem requerer um tempo de mais de três horas para total digestão e induzir ao desconforto gástrico. Porquanto, recomenda-se que sejam preferidas refeições pobres em fibras, proteínas e ricas em carboidratos de consistência leve ou líquida em quantidade suficiente de líquido, pobre em gordura para facilitar o esvaziamento gástrico, manter a glicemia e elevar o estoque de glicogênio.
Todavia nem sempre os corredores adotam tais recomendações, segundo o estudo de Cardoso et al. [13] a maioria dos componentes da amostra estudada realizava uma alimentação para suprir as necessidades em relação a corrida, mas consumiam refeições ricas em fibras, legumes, verduras, hortaliças entre outras subclasses de alimentos que exige um maior tempo de digestão. Os autores ainda enfatizam que há maior consumo de proteínas em alta quantidade, consumo de bebidas à base de cafeína, preferência por vitamina de frutas com leite para elevar o aporte calórico e maior consumo de oleaginosas.
Nesse sentido, os estudos sobre a temática demonstram que a saúde dos atletas pode ser favorecida pelas alterações dietéticas e não há controvérsias quanto aos efeitos benéficos, a modificação da composição corporal e ao aprimoramento do desempenho [22].
As correlações observadas entre os sintomas gastrointestinais e o consumo alimentar indicam que tanto a ingestão ao longo das 24 horas anteriores à prova quanto à refeição pré-corrida desempenha papéis importantes na manifestação desses desconfortos. Dessa forma, demonstrando que a orientação alimentar adequada pode colaborar para a redução dos sintomas promovendo um melhor desempenho nas provas e auxiliar também na recuperação pós-prova.
Dentre as limitações deste estudo, destacam-se o número reduzido de participantes, a coleta de dados restrita a um único dia de competição. Ainda, embora o consumo alimentar avaliado tenha sido referente às 24 horas que antecederam a competição, é importante destacar que esse período correspondeu a um dia de final de semana, o que pode ter influenciado o padrão alimentar, tornando-o diferente do habitual.
Dada a correlação entre a alimentação e o desempenho observado neste estudo, é essencial ressaltar a importância de estratégias alimentares adequadas, especialmente para atletas iniciantes. A nutrição esportiva, aliada ao suporte profissional, desempenha um papel crucial no desenvolvimento de planos alimentares personalizados que atendam às necessidades específicas de cada atleta. Além disso, uma abordagem cuidadosa na escolha dos alimentos, incluindo a redução de alimentos que possam causar desconfortos gastrointestinais, é importante para maximizar os benefícios do treinamento e melhorar a performance, prevenindo lesões e otimizando os resultados a longo prazo.
Os resultados desse estudo apontaram para uma maior participação do público feminino na competição. A maior ocorrência de sintomas gastrointestinais foi observada no grupo com menor tempo de prática do esporte. Houve correlação entre consumo alimentar (energia, carboidratos, proteínas e lipídios) e sintomas gastrointestinais. O consumo de carboidratos e proteínas na refeição pré-corrida apresentou uma forte correlação com sintomas como vômito, dor epigástrica, urgência fecal, diarreia e flatulência.
Por fim, destaca-se a necessidade de estudos com um número maior de participantes para tornar os resultados mais representativos. Além disso, é importante que futuras pesquisas avaliem a composição da dieta de forma mais detalhada, considerando os tipos de macronutrientes, especialmente os diferentes tipos de carboidratos. Isso permitirá compreender melhor a relação entre o consumo alimentar e os sintomas apresentados.
Os autores gostariam de agradecer a todos os participantes do estudo, cuja colaboração foi essencial para a realização desta pesquisa e aos organizadores do evento esportivo em que os dados foram coletados. Nosso agradecimento também se estende à Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO) pelo suporte técnico e pela aprovação ética necessária para o desenvolvimento deste trabalho.
Conflitos de interesse
Os autores declaram não haver conflitos de interesse de qual quer natureza.
Fontes de financiamento
Financiamento próprio.
Contribuição dos autores
Concepção e desenho da pesquisa: Soares JG, Biasuz T; Obtenção de dados: Soares JG, Biasuz T, Kaminski KDV; Análise e interpretação dos dados: Soares JG, Biasuz T; Análise estatística: Biasuz T, Viencz T; Redação do manuscrito: Soares JG, Biasuz T, Viencz T, Amaral LA, Santos EF; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Biasuz T, Viencz T, Amaral LA, Santos EF, Kaminski KDV.
Referências
1. Sanfelice R, Souza MK, Neves RVP, Rosa TS, Olher RR, Souza LHR, Moraes MR. Análise qualitativa dos fatores que levam à prática da corrida de rua. Revista Brasileira de Prescrição e Fisiologia do Exercício [Internet]. 2017 [citado 11 junho 2025];11(64):83-88. Disponível em: https://www.rbpfex.com.br/index.php/rbpfex/article/view/1080/886.
2. Dantas CL, Belous LÁ, Matos MB, Costa TNF. Prevalência de sintomas gastrointestinais durante competição nacional de Triathlon. Revista Brasileira de Nutrição Esportiva [Internet]. 2017 [citado 11 junho 2025];11(64):477-484. Disponível em: https://www.rbne.com.br/index.php/rbne/article/view/835/653.
3. Pugh JN, Kirk B, Fearn R, Morton JP, Close GL. Prevalence, Severity and Potential Nutritional Causes of Gastrointestinal Symptoms during a Marathon in Recreational Runners. Nutrients [Internet]. 2018 [citado 11 junho 2025];10(7):811. Disponível em: https://www.mdpi.com/2072-6643/10/7/811
4. Łagowska K, Bajerska J, Kamiński S, Del Bo’ C. Effects of Probiotics Supplementation on Gastrointestinal Symptoms in Athletes: A Systematic Review of Randomized Controlled Trials. Nutrients [Internet]. 2022 [citado 11 junho 2025];14(13):2645. Disponível em: https://www.mdpi.com/2072-6643/14/13/2645
5. Nascimento MAD, Guilherme FR, Ferreira SA, Januário RSB, Ribeiro AS, Mayhew JL, et al. Hydration status, sweating rate, heart rate and perceived exertion after running sessions in different relative humidity conditions: a randomized controlled trial. Revista Brasileira de Ciências do Esporte [Internet]. 2020 [citado 11 junho 2025];42:e2009. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbce/a/fx83bKmfpDHFFB5Qqy83zSk/.
6. Maia EC, Costa HA, Castro Filha JGLD, Oliveira Junior MNSD. Estado de hidratação de atletas em corrida de rua de 15 km sob elevado estresse térmico. Revista Brasileira de Medicina do Esporte [Internet]. 2015 [citado 11 junho 2025]; 21(3):187-191. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbme/a/6snpw53JBnrFXNrggVfgmNs/.
7. Casa DJ, Armstrong LE, Hillman SK, Montain SJ, Reiff RV, Rich BS, Stone, JA. National Athletic Trainers’ Association Position Statement: Fluid Replacement for Athletes. Journal of Athletic Training [Internet]. 2000 [citado 11 junho 2025];35(2): 212-224. Disponível em: https://www.nata.org/sites/default/files/FluidReplacementsForAthletes.pdf#:~:text=The%20purpose%20of%20this%20position%20stand%20is%20to,influence%20optimal%20rehydration%20during%20and%20after%20athletic%20participation.
8. Casa DJ, Cheuvront SN, Galloway SD, Shirreffs SM. Fluid needs for training, competition, and recovery in track-and-field athletes. International Journal of Sport Nutrition and Exercise Metabolism [Internet]. 2019 [citado 11 junho 2025];29(2):175-180. Disponível em: https://journals.humankinetics.com/view/journals/ijsnem/29/2/article-p175.xml.
9. Barley OR, Chapman DW, Abbiss CR. Reviewing the current methods of assessing hydration in athletes. International Journal of Sport Nutrition and Exercise Metabolism [Internet]. 2020 [citado 11 junho 2025];17(1). Disponível em: https://jissn.biomedcentral.com/articles/10.1186/s12970-020-00381-6
10. Judge LW, Bellar DM, Popp JK, Craig BW, Schoeff MA, Hoover DL, Al-Nawaiseh AM. Hydration to maximize performance and recovery: Knowledge, attitudes, and behaviors among collegiate track and field throwers. Journal of Human Kinetics [Internet]. 2021 [citado 11 junho 2025];79(1):111-122. Disponível em: https://jhk.termedia.pl/Hydration-to-Maximize-Performance-And-Recovery-Knowledge-Attitudes-and-Behaviors,158616,0,2.html.
11. Marchioni DML, Steluti J. Manual fotográfico de quantificação alimentar. Curitiba: Universidade Federal do Paraná; 2017. 147 p.
12. Ferreira MER, Cedraz MC, Campos ALP, Melo FT. Avaliação da desidratação de corredores de rua de Feira de Santana-BA. Revista Brasileira de Nutrição Esportiva [Internet]. 2018 [citado 11 junho 2025];11(68):1004-1018. Disponível em: https://www.rbne.com.br/index.php/rbne/article/view/944/717.
13. Cardoso AF, Ferreira ES, Santos LV. Frequência do consumo alimentar de praticantes de corrida de rua categoria amador na cidade de Teresina-PI. Revista Brasileira de Nutrição Esportiva [Internet]. 2019 [citado 11 junho 2025];13(78):139-149. Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/228739192.pdf.
14. Antonio DS, Laux RC. Quem são e com quem treinam os corredores de rua de Chapecó? Educación Física y Ciencia [Internet]. 2022 [citado 11 junho 2025];24(1):1-12. Disponível em: https://www.scielo.org.ar/scielo.php?pid=S2314-25612022000100208&script=sci_arttext.
15. Ribeiro AS. Análise do grau de desidratação em corredores de rua de 10km em teste com velocidade constante supra limiar com e sem hidratação. [Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação em Educação Física]. [Curitiba]: Universidade Tecnológica Federal do Paraná; 2012. 41 p. Disponível em: https://repositorio.utfpr.edu.br/jspui/handle/1/7949
16. Maughan RJ, Shirreffs SM. Dehydration and rehydration in competative sport. Scandinavian Journal of Medicine & Science in Sports [Internet]. 2010 [citado 11 junho 2025];20(3):40-57. Disponível em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/j.1600-0838.2010.01207.x.
17. Oliveira EP, Burini RC, Jeukendrup A. Gastrointestinal Complaints During Exercise: Prevalence, Etiology, and Nutritional Recommendations. Sports Medicine [Internet]. 2014 [citado 11 junho 2025]; 44(1):79-85. Disponível em: https://pmc.ncbi.nlm.nih.gov/articles/PMC4008808/.
18. Lira CABD, Vancini RL, Silva ACD, Nouailhetas VLA. Efeitos do exercício físico sobre o trato gastrintestinal. Revista Brasileira de Medicina do Esporte [Internet]. 2008 [citado 11 junho 2025];14(1):64–7. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbme/a/9fbDcCPGLdWp8CpTCthrdnd/.
19. Medeiros SMR, Fernandes LR, Landim RCSL, Loureiro ACC, Oliveira AC. Alimentação pré-exercício e sintomas de desconforto gastrointestinais e físicos durante treinamento de natação. Revista Brasileira de Nutrição Esportiva [Internet]. 2020 [citado 11 junho 2025]; 14(84):33-39. Disponível em: https://www.rbne.com.br/index.php/rbne/article/view/1593/1167.
20. Sessions J, Bourbeau K, Rosinski M, Szczygiel T, Nelson R, Sharma N, et al. Carbohydrate gel ingestion during running in the heat on markers of gastrointestinal distress. European Journal of Sport Science [Internet]. 2016 [citado 11 junho 2025];16(8):1064–72. Disponível em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1080/17461391.2016.1140231.
21. Silva MDO. Problemas Gastrointestinais em Desportos de Endurance. [Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação em Nutrição]. [Porto]: Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto; 2018. 24 p.
22. Carvalho T. Modificações dietéticas, reposição hídrica, suplementos alimentares e drogas: comprovação de ação ergogênica e potenciais riscos para a saúde. Revista Brasileira de Medicina do Esporte [Internet]. 2009 [citado 11 junho 2025];15(3):2–12. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbme/a/4Y4gRJxwpZjVT4PsXRxtH9k/?lang=pt.