ARTIGO ORIGINAL
Qualidade nutricional da alimentação complementar: comparação entre diferentes métodos
Nutritional quality of complementary feeding: comparison between different methods
Thamara Rodrigues Melo dos Santos1, Maria Francisca de Conceição Maciel Targino1, Pietra Maria Pereira de Lima1, Bianca Rufino Pimenta1, Rogério Mellato Netto1, Cinthia Karla Rodrigues do Monte Guedes1
1Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Paraíba, PB, Brasil
Recebido em: 23 de Abril de 2025; Aceito em: 5 de Maio de 2025
Correspondência: Cinthia Karla Rodrigues do Monte Guedes, ckrodrigues@hotmail.com
Como citar
Santos TRM, Targino MFCM, Lima PMP, Pimenta BR, Netto RM, Guedes CKRM. Qualidade nutricional da alimentação complementar: comparação entre diferentes métodos. Nutr Bras. 2025;24(2):1407-1422. doi:10.62827/nb.v24i2.3061
Introdução: Nos primeiros anos de vida, a alimentação infantil desempenha um papel fundamental na formação de hábitos alimentares a longo prazo. A alimentação complementar (AC) deve ser iniciada aos seis meses, fornecendo nutrientes essenciais para o desenvolvimento do infante. Os métodos de introdução alimentar variam culturalmente e incluem o tradicional, o Baby-Led Weaning (BLW) e o participativo. Entretanto, a escolha do método ideal ainda é incerta. Objetivo: Identificou-se diferentes formas de introduzir a alimentação complementar infantil e como isso interfere na qualidade nutricional da dieta. Métodos: Estudo transversal ao qual foram entrevistadas 39 mulheres e 40 crianças que forneceram informações sobre consumo alimentar e introdução da alimentação complementar. A díade mãe-filho fez parte da pesquisa “Avaliação de habilidades culinárias de puérperas de um Hospital Universitário” na ocasião em que estiveram internadas no Hospital Universitário Lauro Wanderley, no período entre fevereiro e maio de 2021. O contato ocorreu via telefone ou WhatsApp, utilizando questionários para avaliar a alimentação infantil. Resultados: o método tradicional favorece o consumo de frutas amassadas, enquanto o BLW/misto estimula maior exploração alimentar, com prevalência de frutas em pedaços. Contudo, o ritmo de aceitação pode ser mais lento nesse último método. Conclusão: O método de introdução alimentar influencia a forma como as frutas são consumidas, impactando os hábitos alimentares iniciais das crianças.
Palavras-chave: Comportamento alimentar; Crescimento e Desenvolvimento; Nutrição da Criança.
Introduction: In the first years of life, infant feeding plays a fundamental role in shaping long-term eating habits. Complementary feeding (CF) should be started at six months of age, providing essential nutrients for the infant’s development. Feeding introduction methods vary culturally and include traditional, Baby-Led Weaning (BLW) and participatory. However, the choice of the ideal method is still uncertain. Objective: To identify different ways of introducing complementary feeding to children and how this affects the nutritional quality of the diet. Methods: A cross-sectional study in which 39 women and 40 chidrens were interviewed and provided information on food consumption and the introduction of complementary feeding. The mother-child dyad was part of the research “Evaluation of the cooking skills of puerperal women at a University Hospital” when they were admitted to the Lauro Wanderley University Hospital, between February and May 2021. Contact was made via telephone or WhatsApp, using questionnaires to assess infant feeding. Results: the traditional method favors the consumption of mashed fruit, while the BLW/mixed method encourages greater food exploration, with a prevalence of fruit in pieces. However, the rate of acceptance may be slower in the latter method. Conclusion: the method of food introduction influences the way fruit is consumed, impacting on eating habits.
Keywords: Feeding behavior; Growth and Development; Child Nutrition.
A alimentação de crianças até os dois anos de idade passa por diversas mudanças sensoriais, sendo recomendado o aleitamento materno exclusivo até os seis meses, seguido da introdução alimentar após este período [1]. Essa Alimentação Complementar (AC), junto com a amamentação, complementa as necessidades calóricas e outros nutrientes, incluindo vitaminas e minerais, essenciais para a fase de desenvolvimento [2].
Além disso, o período da gestação até os 2 anos de idade da criança é chamado de “janela de oportunidades”, pois intervenções nesse período podem resultar na redução de danos ao crescimento e ao neurodesenvolvimento, prevenção de doenças crônicas não transmissíveis e redução da mortalidade. É na infância que ocorre a formação de muitos hábitos alimentares que se estenderão ao longo da vida [3].
A introdução de uma alimentação sólida não se restringe apenas ao fato de alimentar a criança, mas também de ofertar uma alimentação complementar saudável, livre de alimentos industrializados e ultraprocessados [1]. Entretanto, este é um momento delicado, pois o infante é apresentado a várias novidades, desde utensílios, como copo, prato e colher, até os diferentes alimentos.
Experimentar sabores, cheiros e texturas demanda paciência e pode gerar uma descoberta gostosa, mas também estressante para a mãe e/ou criança, o que é capaz de contribuir para o aumento do medo da criança de comer. Por isso, é fundamental que essa introdução ocorra de forma gradual, flexível e com a dedicação de tempo e paciência dos pais [4].
Os métodos de introdução alimentar variam dentre as diferentes culturas e regiões, sendo os seguintes métodos existentes: tradicional, Baby-Led Weaning - BLW ou participativo [5]. No método tradicional, o adulto é quem conduz a oferta das refeições ao lactente, assim como também determina o ritmo, duração da refeição e os alimentos que serão ingeridos [6].
O método BLW preconiza uma abordagem multissensorial na qual o lactente, com as próprias mãos, interage com formas, cores, sabores e texturas dos alimentos, possibilitando uma melhora no desenvolvimento da coordenação motora fina e cognitiva [7,8]. Por fim, a abordagem participativa advém da condescendência ao método “guiado pelo bebê”, em que unifica os conceitos das duas abordagens [9].
Atualmente, ainda existem lacunas sobre qual o melhor método a se aplicar para a alimentação complementar. Desta forma, considerando a importância da AC e as dúvidas existentes sobre o método mais oportuno, investigou-se se diferentes formas de introduzir a alimentação complementar interferem na qualidade nutricional da dieta infantil.
Trata-se de um estudo transversal realizado com binômios mãe-filho que estavam passando pelo processo de introdução alimentar, estabelecendo esse critério como inclusão. Mulheres que haviam perdido os filhos foram excluídas da pesquisa. A≈população do estudo foi composta por mães participantes da pesquisa “Avaliação de habilidades culinárias de puérperas de um Hospital Universitário” (CAAE: 28644919.0.0000.5183). Essas mães estavam internadas na Unidade de Obstetrícia do Hospital Universitário Lauro Wanderley, vinculado à Universidade Federal da Paraíba, Campus João Pessoa, durante o período de fevereiro a maio de 2021. A coleta de dados ocorreu após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
Os dados foram coletados a partir de um questionário baseado em dois instrumentos previamente consolidados na literatura: adaptado do formulário de marcadores de consumo alimentar [10] e de um questionário da pesquisa sobre a introdução da alimentação complementar em lactentes de uma cidade da Serra Gaúcha [11].
Foram utilizados dois meios de comunicação, sendo as mães contatadas por ligações telefônicas e/ou mensagens via WhatsApp, conforme preferissem, ocasião em que foi aplicado o questionário. Nas ligações telefônicas, as alternativas foram lidas, e as respostas anotadas pelos pesquisadores. No caso do WhatsApp, foi enviado um link de acesso ao formulário do Google Forms, com as respostas registradas na plataforma. Quando as mulheres não souberam identificar o tipo de introdução alimentar pela terminologia, os pesquisadores realizaram discernimento por meio da forma e textura do alimento ofertado.
Os dados foram expressos a partir de estatísticas descritivas, realizadas por meio do software SPSS (Statistical Package for Social Sciences) para Windows, na versão 21.0. Para a caracterização da amostra, os dados qualitativos foram apresentados na forma de frequência absoluta e relativa. O teste de qui-quadrado foi utilizado para verificar associações entre variáveis categóricas, considerando-se significativo quando p<0,05.
O estudo avaliou 39 mães e 40 crianças, de ambos os sexos. A maioria das crianças 90% (n=36) passava a maior parte do tempo com a mãe, 47,5% viviam com ambos os pais (n=19) e 40% moravam com a mãe, o pai e outros membros da família. A maioria das mulheres não trabalhava fora de casa (82,5%) (Tabela 1).
Tabela 1 – Caracterização social de mães e infantes em processo de introdução alimentar. João Pessoa, Paraíba, 2023
|
Variáveis |
N |
% |
|
Moradia própria |
||
|
Sim |
19 |
47,5 |
|
Não |
21 |
52,5 |
|
Com quem os infantes moram |
||
|
Mãe |
3 |
7,5 |
|
Pai |
1 |
2,5 |
|
Mãe e pai |
19 |
47,5 |
|
Mãe, pai e outros familiares |
16 |
40,0 |
|
Pessoas no domicílio |
||
|
2-3 pessoas |
23 |
57,5 |
|
4-5 pessoas |
16 |
40,0 |
|
>5 pessoas |
1 |
2,5 |
|
Com quem os infantes passam mais tempo |
||
|
Mãe |
36 |
90,0 |
|
Pai |
1 |
2,5 |
|
Outros |
3 |
7,5 |
|
Mãe trabalha fora de casa |
||
|
Sim |
6 |
15,0 |
|
Não |
33 |
82,5 |
|
Mãe trabalha em home office |
||
|
Sim |
7 |
17,5 |
|
Não |
32 |
80,0 |
|
Jornada de trabalho da mãe |
||
|
Não trabalha |
25 |
62,0 |
|
20 h semanais |
7 |
17,5 |
|
30 h semanais |
2 |
5,0 |
|
40 h semanais |
5 |
12,5 |
Fonte: Autoria própria, 2023.
Na Tabela 2, é possível observar que 67,5% (n=27) das crianças receberam aleitamento materno exclusivo até o sexto mês, enquanto 32,5% (n=13) não o receberam exclusivamente, sendo feita uma IA precoce, antes dos seis meses. Em relação à oferta de fórmula infantil, 57,5% (n=23) das crianças receberam fórmula infantil em algum momento, enquanto 42,5% (n=17) não a receberam.
Durante o período indicado para a amamentação exclusiva, 34% (n=18) das crianças não recebiam mais o leite materno. Diversos motivos contribuíram para essa interrupção, incluindo o retorno da mãe ao trabalho, desafios enfrentados durante a amamentação, o uso de medicamentos incompatíveis com a amamentação, a introdução de fórmulas infantis, a falta de interesse da criança, a decisão da mãe de não continuar amamentando e a insuficiência de leite, segundo relatos.
Tabela 2 – Caracterização dos infantes em relação ao aleitamento materno. João Pessoa, Paraíba, 2023
|
Variáveis |
n |
% |
|
A criança recebeu aleitamento materno |
||
|
Sim |
37 |
92,5 |
|
Não |
3 |
7,5 |
|
Amamentou exclusivamente até o 6° mês |
||
|
Sim |
27 |
67,5 |
|
Não |
13 |
32,5 |
|
O infante continua mamando |
||
|
Sim |
22 |
65,0 |
|
Não |
18 |
35,0 |
|
Oferta de fórmula láctea comercial |
||
|
Sim |
23 |
57,5 |
|
Não |
17 |
42,5 |
|
Oferta de outro leite que não seja o leite materno |
||
|
Sim |
24 |
60,0 |
|
Não |
16 |
40,0 |
Fonte: Autoria própria, 2023.
Na Tabela 3, 57,5% (n=23) começou a IA aos 6 meses de idade, mas 27,5% (n=11) iniciou a IA precocemente, antes do período indicado. Quanto ao método de IA, a maioria das mães 67,5% (n=27) optou por uma abordagem tradicional, enquanto 32,5% (n=13) escolheram uma abordagem de BLW ou uma combinação de métodos. Predominantemente, o primeiro alimento ofertado foi a fruta com 62,5% (n=25) e na escolha da consistência, 62,5% (n=25) das mães optaram por uma textura amassada, enquanto 27,5% (n=11) escolheram uma consistência normal, e 10% (n=4) optaram por alimentos liquidificados.
Tabela 3 – Aspectos da introdução alimentar das crianças. João Pessoa, Paraíba, 2023
|
Variáveis |
N |
% |
|
Idade que foi iniciada a IA |
||
|
< 4 meses |
1 |
2,5 |
|
4-5 meses |
10 |
25,0 |
|
6 meses |
23 |
57,5 |
|
> 6 meses |
6 |
15,0 |
|
Tipo de IA |
||
|
Tradicional |
27 |
67,5 |
|
BLW/Mista |
13 |
32,5 |
|
Consistência utilizada |
||
|
Amassada |
25 |
62,5 |
|
Liquidificada |
4 |
10,0 |
|
Normal |
11 |
27,5 |
|
Quem prepara as refeições da criança |
||
|
Mãe |
36 |
90,0 |
|
Outros familiares |
4 |
10,0 |
|
Primeiro alimento ofertado ao infante na IA |
||
|
Fruta |
25 |
62,5 |
|
Suco |
9 |
22,5 |
|
Papa salgada |
1 |
2,5 |
|
Papa doce |
2 |
5,0 |
|
Legumes |
2 |
5,0 |
|
Alimentação normal |
1 |
2,5 |
|
Consulta de rótulos de alimentos antes de ofertar um alimento para a criança? |
||
|
Sim |
21 |
53,8 |
|
Não |
17 |
43,6 |
|
Não oferto alimentos com rótulos |
1 |
2,6 |
|
O que observa no rótulo |
||
|
Validade |
3 |
7,7 |
|
Composição |
12 |
30,8 |
|
Validade e composição |
8 |
7,7 |
|
Idade permitida para consumo, validade e composição |
2 |
5,1 |
|
Não observa rótulos |
19 |
48,7 |
|
Oferta de orientações sobre IA |
||
|
Não recebi orientação |
12 |
30,8 |
|
Nutricionista |
10 |
25,6 |
|
Médico/Pediatra |
9 |
23,1 |
|
Familiares ou conhecidos que não são da área de saúde |
4 |
10,3 |
|
Nutricionista e médico/pediatra |
2 |
5,1 |
|
Todos |
2 |
5,1 |
|
Seguiu e concordou com as orientações passadas |
||
|
Sim |
28 |
71,8 |
|
Não |
8 |
20,5 |
Fonte: Autoria própria, 2023.
Na Tabela 4, é apresentado um comparativo dos atributos da introdução alimentar, que analisa os diferentes métodos de introdução alimentar utilizados. Os dados indicam uma diferença significativa entre os grupos que adotaram o método tradicional e aqueles que optaram pelo método BLW ou método misto, especialmente no que diz respeito à consistência das frutas consumidas. Essa variação sugere que os diferentes métodos de introdução alimentar influenciam a escolha e a textura dos alimentos oferecidos às crianças.
Tabela 4 – Comparativo de atributos da introdução alimentar em relação ao método de introdução alimentar. João Pessoa, 2023.
|
Variável |
Tradicional |
BLW/Mista |
Total |
p valor |
|
Consumo de frutas |
0,000 |
|||
|
Sim |
27 |
12 |
40 |
|
|
Não |
0 |
1 |
0 |
|
|
Consistência da fruta** |
0,007 |
|||
|
Amassada |
19 |
12 |
22 |
|
|
Pedaços |
8 |
1 |
18 |
|
|
Consumo de frutas ricas em vitamina C** |
0,538 |
|||
|
Sim |
24 |
2 |
37 |
|
|
Não |
3 |
11 |
3 |
|
|
Ingestão de sucos** |
0,120 |
|||
|
Sim |
23 |
5 |
31 |
|
|
Não |
4 |
8 |
9 |
|
|
Se sim, foi ofertado |
||||
|
Sem adição de açúcar |
15 |
6 |
23 |
|
|
Com adição de açúcar |
8 |
7 |
8 |
|
|
Consumo de comida de panela** |
1,000 |
|||
|
Sim |
25 |
2 |
38 |
|
|
Não |
2 |
11 |
2 |
|
|
Consumo de mingau com leite* |
1,015 |
|||
|
Sim |
17 |
1 |
23 |
|
|
Não |
10 |
12 |
17 |
|
|
Consumo de derivados de leite* |
1,538 |
|||
|
Sim |
9 |
0 |
16 |
|
|
Não |
18 |
13 |
24 |
|
|
Consumo de verduras em geral** |
1,000 |
|||
|
Sim |
25 |
12 |
37 |
|
|
Não |
2 |
1 |
3 |
|
|
Consumo de vegetais escuros* |
1,053 |
|||
|
Sim |
8 |
6 |
14 |
|
|
Não |
19 |
7 |
26 |
|
|
Consumo de vegetais alaranjados |
0 |
|||
|
Sim |
27 |
13 |
40 |
|
|
Não |
0 |
0 |
0 |
|
|
Consumo de legumes** |
0,690 |
|||
|
Sim |
20 |
11 |
31 |
|
|
Não |
7 |
2 |
9 |
|
|
Consumo de carnes em geral** |
0,662 |
|||
|
Sim |
23 |
10 |
33 |
|
|
Não |
4 |
3 |
7 |
|
|
Consumo de ovos** |
1,000 |
|||
|
Sim |
19 |
10 |
29 |
|
|
Não |
8 |
3 |
11 |
|
|
Consumo de fígado** |
0,700 |
|||
|
Sim |
6 |
4 |
10 |
|
|
Não |
21 |
9 |
30 |
|
|
Consumo de embutidos** |
0,284 |
|||
|
Sim |
4 |
0 |
4 |
|
|
Não |
23 |
13 |
36 |
|
|
Consumo de leguminosas** |
0,284 |
|||
|
Sim |
23 |
13 |
36 |
|
|
Não |
4 |
0 |
4 |
|
|
Consumo de pães, arroz, farinha ou macarrão** |
0,643 |
|||
|
Sim |
22 |
12 |
34 |
|
|
Não |
5 |
1 |
6 |
|
|
Consumo de raízes** |
0,643 |
|||
|
Sim |
22 |
12 |
34 |
|
|
Não |
5 |
1 |
6 |
|
|
Consumo de macarrão instantâneo, salgadinhos de pacote** |
1,000 |
|||
|
Sim |
5 |
2 |
7 |
|
|
Não |
22 |
11 |
33 |
|
|
Consumo de biscoitos salgados* |
0,129 |
|||
|
Sim |
12 |
5 |
17 |
|
|
Não |
15 |
8 |
23 |
|
|
Consumo de biscoitos doces* |
1,015 |
|||
|
Sim |
17 |
6 |
23 |
|
|
Não |
10 |
7 |
17 |
|
|
Consumo de biscoitos recheados** |
1,000 |
|||
|
Sim |
4 |
2 |
6 |
|
|
Não |
23 |
11 |
34 |
|
|
Consumo de doces e guloseimas** |
0,643 |
|||
|
Sim |
5 |
1 |
6 |
|
|
Não |
22 |
12 |
34 |
|
|
Ingestão de bebidas adoçadas** |
0,538 |
|||
|
Sim |
3 |
0 |
3 |
|
|
Não |
24 |
13 |
37 |
|
|
Consumo de outros óleos** |
1,000 |
|||
|
Sim |
6 |
2 |
8 |
|
|
Não |
21 |
11 |
32 |
|
|
Consumo de azeite* |
0,657 |
|||
|
Sim |
7 |
5 |
12 |
|
|
Não |
20 |
8 |
28 |
|
|
Consumo de margarina** |
1,000 |
|||
|
Sim |
4 |
1 |
5 |
|
|
Não |
23 |
12 |
35 |
|
|
Consumo de manteiga** |
0,700 |
|||
|
Sim |
6 |
4 |
10 |
|
|
Não |
21 |
9 |
30 |
*Qui-quadrado de Pearson **Fisher’s Exact Test
Nesta pesquisa, observou-se que a maioria das crianças teve acesso ao consumo de alimentos desejáveis, destacando-se a oferta da chamada “comida de panela”. O Guia Alimentar para Crianças Brasileiras Menores de 2 Anos recomenda que a alimentação da criança deve ser a mesma consumida pela família, enfatizando a importância de preparar refeições com alimentos in natura ou minimamente processados. Além disso, é crucial ter cuidado para evitar o excesso de gordura, sal e condimentos [12]. Essa abordagem não apenas otimiza o tempo de preparação das refeições, mas também promove uma alimentação adequada e saudável, beneficiando tanto a criança quanto toda a família.
Os resultados sobre o consumo de frutas sugerem uma clara distinção na forma como esses alimentos são introduzidos nas dietas das crianças, dependendo do método adotado. O método tradicional demonstra uma preferência significativa por frutas amassadas entre as crianças, enquanto o método BLW/misto se destaca pela prevalência de frutas em pedaços. Esses achados estão em consonância com a pesquisa de Dogan et al. [13], que identificou implicações relevantes para a prática alimentar infantil.
No método tradicional, a introdução gradual de alimentos processados pode estar associada a uma maior aceitação de frutas, possivelmente devido à familiaridade das crianças com opções como papinhas de frutas. Em contrapartida, o BLW/misto adota uma abordagem mais interativa, permitindo que as crianças explorem alimentos e suas texturas; no entanto, esse método pode levar a um processo de aceitação mais lento em relação ao consumo de frutas. Essa análise ressalta a importância de considerar as características de cada método de introdução alimentar e suas consequências para a aceitação de frutas na dieta infantil.
Além disso, a maioria das crianças apresentou consumo de alimentos pertencentes ao grupo das verduras. Assim como as frutas, as verduras são ricas em fibras e micronutrientes essenciais para o desenvolvimento infantil [12]. Notavelmente, os vegetais alaranjados, como abóbora, jerimum e cenoura, foram consumidos por todas as crianças, destacando-se como fontes significativas de vitamina A.
Segundo Cozzolino [14], a deficiência em vitamina A é uma preocupação de saúde pública, considerando-se uma das principais causas da cegueira em crianças em países em desenvolvimento. Esse resultado é encorajador, pois indica uma boa consciência nutricional por parte dos cuidadores, refletindo um esforço para garantir que as crianças recebam nutrientes cruciais em suas dietas. Essa conscientização é fundamental para promover uma alimentação saudável e prevenir deficiências nutricionais que podem ter consequências duradouras para a saúde das crianças.
No entanto, entre os vegetais verde-escuros, como couve, caruru, beldroega, bertalha, espinafre e mostarda, observou-se um consumo reduzido, independentemente do tipo de introdução alimentar. Esses alimentos, além de serem fontes de vitamina A, também são ricos em ferro e vitamina C [12]. A deficiência de ferro pode levar ao desenvolvimento de anemia, que por sua vez está associada a efeitos negativos no desenvolvimento mental das crianças, incluindo apatia, irritabilidade e diminuição da capacidade de concentração e aprendizado [14].
Além disso, a falta de vitamina C pode aumentar a suscetibilidade à doença de Barlow, uma condição cardíaca que pode afetar o crescimento e a saúde geral das crianças [15]. Portanto, é preocupante que o consumo de vegetais verde-escuros, que oferecem tantos benefícios nutricionais, seja tão baixo, ressaltando a necessidade de estratégias para incentivá-los na alimentação infantil, visando a promoção de um desenvolvimento saudável e a prevenção de deficiências nutricionais.
O consumo de carnes e ovos é importante para a criança, visto que alimentos deste grupo possuem proteína, gordura, ferro, zinco e vitamina B12 em sua composição [12]. Apesar das crianças consumirem carne, é possível observar uma redução na ingestão de ovos e fígado. Além de todos os nutrientes citados anteriormente, o fígado é um alimento que contém muita vitamina A [12].
Em estudo realizado por Alleo, Souza e Szarfarc [16], que tinha por objetivo descrever as práticas alimentares de crianças no primeiro ano de vida, também foi encontrado um baixo consumo de fígado. Os autores destacam que a ingestão de fígado é pouco frequente na alimentação infantil, podendo levar ao comprometimento do fornecimento de micronutrientes como zinco, cobre e ferro.
No que diz respeito aos alimentos indesejáveis para o consumo infantil, uma parte do grupo tradicional incluiu a oferta de embutidos, como hambúrgueres, nuggets, salsichas, salames, linguiças, presuntos e mortadelas. Embora a carne seja o principal ingrediente desses produtos, eles contêm uma quantidade excessiva de aditivos, sódio e gordura saturada, substâncias associadas ao aumento do risco de desenvolvimento de doenças cardíacas [17].
Além disso, o estudo de Lucena et al. [18] analisou os marcadores de consumo de alimentos ultraprocessados e encontrou que os embutidos de carne também estão relacionados ao desenvolvimento de obesidade, hipertensão e câncer. Essa situação é alarmante, pois ressalta a necessidade de conscientização entre os cuidadores sobre os riscos associados à introdução desses alimentos na dieta infantil. Reduzir o consumo de embutidos e optar por opções mais saudáveis pode ter um impacto significativo na saúde a longo prazo das crianças, promovendo um padrão alimentar mais equilibrado e nutritivo.
De acordo com o Ministério da Saúde [12], assim como as carnes, os alimentos do grupo dos cereais e raízes são frequentemente utilizados como ingredientes em alimentos ultraprocessados, como macarrão instantâneo e salgadinhos de pacote. No entanto, esses produtos não devem ser oferecidos às crianças, pois contêm uma quantidade elevada de aditivos e são nutricionalmente desbalanceados, o que pode prejudicar a saúde infantil.
Na amostra analisada, observa-se que, apesar da baixa oferta de biscoitos recheados, houve uma grande disponibilização de biscoitos salgados e doces, alimentos que não são recomendados para a alimentação infantil. Em ambos os grupos, houve um alto consumo de mingau contendo leite e seus produtos derivados. Isso requer atenção, uma vez que, embora o leite de outras espécies e seus derivados sejam também ricos em proteína, gordura, cálcio e vitamina A, o leite materno ainda é o alimento mais importante e completo para a criança durante os seus primeiros dois anos de vida. Portanto, não é necessário oferecer leite de vaca ou de outros animais, nem fórmulas infantis para crianças que estão sendo amamentadas [12].
Resultados semelhantes foram observados no estudo de Lopes et al. [19], que identificou a inclusão precoce de alimentos processados na alimentação infantil. O estudo também destacou a introdução de derivados do leite e, de maneira particular, o uso de fórmulas infantis antes dos seis meses de idade. Essa prática é preocupante, pois a introdução inadequada de alimentos pode prejudicar a saúde das crianças. É crucial orientar os cuidadores sobre melhores práticas de introdução alimentar para promover escolhas saudáveis desde os primeiros meses de vida.
A análise da amostra revela que a grande maioria consumiu leguminosas, incluindo diversos tipos de feijão, ervilha, grão-de-bico, soja e lentilha. Isso corrobora com o Guia Alimentar para Crianças Brasileiras Menores de Dois Anos [12], que destaca a importância das leguminosas na dieta, sendo boas fontes de proteínas, fibras, ferro, zinco e vitaminas do complexo B. Além disso, a maior parte da amostra também consumiu cereais (como pães, arroz, farinhas e macarrão) e raízes (como batatas, inhame e mandioca).
Esses alimentos, ricos em fibras, minerais e vitaminas, são importantes fontes de carboidratos, essenciais para fornecer energia para que as crianças brinquem, cresçam e se desenvolvam. O azeite e a manteiga são ingredientes culinários utilizados no preparo das refeições para temperar e preparar os alimentos in natura ou minimamente processados, e boa parte da amostra não consumiu nenhum desses alimentos. O consumo adequado e moderado de azeite e manteiga são fontes de energia e importantes para o desenvolvimento infantil [12].
Cabe destacar que, no método tradicional, houve uma oferta de margarina, que é um produto ultraprocessado repleto de aditivos alimentares e que deve ter seu consumo evitado, uma vez que pode levar a problemas como hipertensão, problemas cardíacos e obesidade. Vale ressaltar também que o consumo de óleos não deve ser utilizado para frituras e não deve compor as refeições da criança, pois, além de ser utilizado em excesso, os alimentos tornam-se mais endurecidos e gordurosos [12].
Este estudo demonstrou que os diferentes métodos de introdução alimentar têm um impacto significativo na qualidade nutricional da dieta infantil, influenciando tanto a aceitação quanto a preferência alimentar das crianças. Observou-se que o método tradicional favorece o consumo de frutas amassadas, enquanto o BLW estimula uma maior exploração da textura dos alimentos. Esses resultados destacam a importância do acompanhamento nutricional desde os primeiros anos de vida, visando a formação de hábitos alimentares saudáveis e a redução do consumo precoce de alimentos ultraprocessados. Para aprofundar a compreensão dos efeitos de cada método sobre a nutrição e o comportamento alimentar, são necessários estudos adicionais com populações mais amplas. Além disso, é fundamental que os profissionais orientem pais e responsáveis sobre práticas alimentares adequadas, contribuindo assim para a promoção da saúde e a prevenção de deficiências nutricionais nas crianças.
Vinculação acadêmica
Este artigo representa o Trabalho de Conclusão de Curso de Thamara Rodrigues Melo dos Santos orientado pela Profa. Dra. Cinthia Karla Rodrigues do Monte Guedes na Universidade Federal da Paraíba - Centro de Ciências da Saúde (CCS).
Conflitos de interesse
Os autores declaram não haver conflitos de interesse de qualquer natureza.
Fontes de financiamento
Pesquisa financiada pelo Programa de Iniciação Científica (PIVIC) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) vinculado ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)
Contribuição dos autores
Concepção e desenho da pesquisa: Guedes CKRM; Coleta de dados: Santos TRM, Targino MFCM; Análise e interpretação dos dados: Santos TRM, Guedes CKRM; Análise estatística: Guedes CKRM; Redação do manuscrito: Santos TRM, Targino MFCM, Pimenta BR, Lima PMP, Netto RM; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Guedes CKRM.
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