ARTIGO ORIGINAL
Constipação intestinal: estado nutricional e consumo alimentar de mulheres atendidas em uma clínica escola de nutrição
Intestinal constipation: nutritional status and food consumption of women attended at a nutrition school clinic
Wanessa Mendes1, Luana Jorge de Sousa1, Isabela Rosier Olimpio Pereira1, Ana Paula Bazanelli1, Renata Furlan Viebig1, Marcia Nacif1
1Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, SP, Brasil
Recebido em: 24 de março de 2025; Aceito em: 14 de abril de 2025.
Correspondência: Marcia Nacif, marcia.nacif@mackenzie.br
Como citar
Mendes W, Sousa LJ, Pereira IRO, Bazanelli AP, Viebig RF, Nacif M. Constipação intestinal: estado nutricional e consumo alimentar de mulheres atendidas em uma clínica escola de nutrição. Nutr Bras. 2025;24(1):1337-1349.doi:10.62827/nb.v24i1.3056
Introdução: A constipação intestinal é considerada um problema de saúde pública devido à sua elevada prevalência no mundo todo. Essa enfermidade faz parte das doenças funcionais que acometem o intestino, causando repercussões negativas sobre a qualidade de vida. Sua etiologia é multifatorial, e o hábito alimentar inadequado é um potencial fator de risco. Objetivo: Avaliou-se o estado nutricional e o consumo alimentar de mulheres com constipação, atendidas em uma clínica escola de Nutrição de uma universidade privada de São Paulo. Métodos: Estudo transversal realizado com mulheres, com diagnóstico de constipação intestinal, segundo os critérios da Rome Foundation (ROMEIII) e a escala de Bristol. A composição corporal foi avaliada pelo índice de massa corporal e porcentagem de gordura (bioimpedância InBody® modelo 120). O consumo alimentar foi analisado pela aplicação de um recordatório de 24 horas e os dados foram comparados às recomendações do Institute of Medicine (IOM, 2001) e da Sociedade Brasileira de Cardiologia (2013). Resultados: Foram avaliadas 39 mulheres com idade média de 26 anos (±11). Observou-se que 35,9% (N=14) das participantes, apresentavam-se acima do peso segundo o IMC, com média de porcentagem de gordura de 32,5% (±7). Quanto ao consumo alimentar, verificou-se consumo insuficiente de carboidratos (42,9 % do VET) e fibras (17,1 g) e elevado em gorduras (36,7% do VET). As menores ingestões de água, carboidratos, fibras, cálcio e vitamina C foram observadas nas mulheres obesas. Conclusão: Sugere-se que essas mulheres façam acompanhamento nutricional para melhora do consumo alimentar, estado nutricional e constipação intestinal.
Palavras-chave: Constipação Instestinal; Consumo de Alimentos; Estado Nutricional.
Introduction: Intestinal constipation is considered a public health issue, due to its high prevalence all over the world. This disease is one of the functional diseases that affect the intestine, causing negative repercussions on quality of life. Its etiology is multifactorial, and inadequate eating habits are a potential risk factor. Objective: To evaluate the nutritional status and food consumption of women with constipation, treated at a Nutrition teaching clinic of a private university in São Paulo. Methods: Cross-sectional study conducted with women diagnosed with constipation, according to the Rome Foundation (ROME III) criteria and the Bristol scale. Body composition was assessed by body mass index and fat percentage (InBody bioimpedance model 120). Food consumption was analyzed by applying a 24-hour recall, and the data were compared to the recommendations of the Institute of Medicine (IOM, 2001) and the Brazilian Society of Cardiology (2013). Results: Thirty-nine women with mean age of 26 years (±11) were evaluated. It was observed that 35.9% (N=14) of the participants were overweight according to BMI, with a mean body fat percentage of 32.5% (±7). Regarding food consumption, there was insufficient consumption of carbohydrates (42.9% of VET) and fiber (17.1g) and high consumption of fat (36.7% of VET). The lowest intakes of water, carbohydrates, fiber, calcium and vitamin C were observed in obese women. Conclusion: It is suggested that these women undergo nutritional monitoring to improve food consumption, nutritional status and intestinal constipation.
Keywords: Constipation; Food Consumption; Nutritional Status.
A constipação intestinal é uma enfermidade com elevada prevalência e é considerada uma das queixas mais frequentes nos consultórios médicos [1], acometendo cerca de 20% da população mundial. É mais comum entre mulheres e idosos, representando para estes indivíduos uma limitação preocupante [2].
A constipação intestinal pode ser classificada em aguda quando ocorrem mudanças em hábitos alimentares, diminuição de atividade física, ou uso de medicamentos em pós-operatório. A normalidade é restabelecida espontaneamente, após a cessação dos fatores desencadeantes. Pode também ser classificada em constipação crônica, sendo essa subdividida em funcional e orgânica. A constipação intestinal é considerada como sendo funcional, quando não se origina de alterações anatômicas do canal alimentar, ou motivada por doenças metabólicas, musculares ou neurológicas [3,4] e em orgânica quando se devem às alterações anatômicas da região anorretal e cólon, alterações da inervação, alterações musculares, transtornos endócrinos e metabólicos e enfermidades do tecido conectivo.
Estudos indicam que a etiologia da constipação é multifatorial, e o hábito alimentar inadequado é um potencial fator de risco [4]. Com a ocidentalização e a vida agitada, as refeições da maior parte das pessoas passaram a ser realizadas fora de casa e algumas vezes em seu domicílio, porém, compostas por alimentos quase prontos, pobres em fibras alimentares, probióticos e prebióticos [5]. Mais recentemente, pesquisas têm mostrado associações entre a constipação intestinal e o estado nutricional dos indivíduos.
Embora habitualmente não represente risco à vida, a constipação pode provocar grande desconforto aos portadores e repercutir negativamente na sua qualidade de vida e no seu desempenho pessoal. Na presente pesquisa avaliou-se o estado nutricional e o consumo alimentar de mulheres com constipação intestinal, atendidas em uma clínica escola de Nutrição de uma universidade privada do município de São Paulo.
Estudo com desenho transversal que avaliou 39 mulheres com idade entre 18 e 60 anos e com diagnóstico de constipação intestinal funcional. As participantes foram diagnosticadas com constipação de acordo com as recomendações estabelecidas pelos critérios de ROME III (Quadro 1) e escala de Bristol (Figura 1) após avaliação de uma Nutricionista Clínica.
Quadro 1 – Critérios de ROME III para constipação funcional
Critérios gerais
Critérios específicos: presença de dois ou mais dos seguintes achados
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Fonte: World Gastroenterology Organization, (2010) [6]
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Fonte: World Gastroenterology Organization, (2010) [6] |
Figura 1 – Escala de Bristol da Forma das Fezes
Deixaram de ser incluídas na pesquisa as mulheres que possuíam alguma das seguintes condições pré diagnosticadas: doença metabólica, gravidez, aleitamento, patologias gastrointestinais prévias, história de cirurgia gastrointestinal; doenças que alterassem os hábitos intestinais, como alergias e intolerâncias alimentares, retocolite ulcerativa, doença de Crohn e síndrome do intestino irritável; intolerância à lactose ou aversão ao leite; consumo atual ou recente (menor que 30 dias) de antibióticos, anti-inflamatórios, laxantes ou outras drogas, alteração de medicação de uso contínuo ou uso de outros tipos de produtos probióticos, prebióticos e simbióticos.
Para avaliar a composição corporal das participantes do estudo foram coletados os seguintes dados antropométricos: estatura referida e peso. Para a medição de massa corporal foi utilizada uma balança da marca Toledo com capacidade de 200 Kg e precisão de 100 g. As medidas de peso e altura foram utilizadas para o cálculo do índice de massa corporal (IMC) (peso/altura²) que foi classificado segundo a proposta da Organização Mundial da Saúde (OMS) [7] (17 a 18,4 kg/m2 = magreza grau I, 18,5 a 24,9 kg/m2 = eutrofia, 25 a 29,9 kg/m2 = sobrepeso, 30 a 34,9 kg/m2 = obesidade grau I, 35 a 39,9 kg/m2 = obesidade grau II, ≥40 kg/m2 = obesidade grau III).
Para a avaliação da composição corporal, a porcentagem de gordura corporal das participantes foi avaliada com o auxílio de um equipamento de bioimpedância, da marca InBody®, modelo 120. A classificação dos resultados individuais de percentual de gordura foi feita segundo as referências de Lohman et.al. (1992) [8].
O consumo alimentar das participantes foi avaliado por meio da aplicação de um Recordatório de 24 horas (R24h). Para a análise do consumo alimentar, as medidas caseiras presentes no R24h foram transformadas em gramas, utilizando-se a tabela elaborada por Pinheiro et. al. (2000) [9]. O valor calórico total da dieta, os macronutrientes, fibras, ácidos graxos dietéticos, vitaminas antioxidantes A, C e E, assim como os minerais cálcio, e ferro foram calculados utilizando-se o programa Microsoft Excel®, segundo a Tabela Brasileira de Composição de Alimentos (TBCA). Para a análise de nutrientes foram usadas às recomendações do Institute of Medicine (IOM, 2001), [10] denominadas DRIs (Dietary Reference Intakes). Os lipídios foram avaliados segundo a Sociedade Brasileira de Cardiologia (2013) [11].
Medidas estatísticas descritivas foram calculadas para comparação das características das mulheres avaliadas usando o programa Microsoft Excel®.
O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Presbiteriana Mackenzie, sob o número CAEE: 44151021.9.0000.0084. Todos os procedimentos respeitaram as diretrizes aprovadas pela resolução nº466, de 12 de dezembro de 2012, que regulamenta a ética na pesquisa com seres humanos.
Antes do início da pesquisa, a Clínica Escola foi informada e esclarecida quanto à pesquisa por meio da Carta de Informação à Instituição. Todos os pacientes atendidos na Clínica Escola, como protocolo geral, já consentem em participar voluntariamente de eventuais estudos que sejam realizados pela equipe de docentes e alunos da Universidade, por meio da assinatura em Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), sendo que foram informados de que poderiam retirar tal permissão, sem ônus algum, em qualquer etapa de seu atendimento ou participação.
Foram avaliadas 39 mulheres com idade média de 26 anos (±11). Em relação a prática de atividades físicas, 58,9% (N=23) das mulheres relataram realizar alguma modalidade esportiva.
A Tabela 1 apresenta a distribuição das participantes segundo o estado nutricional.
Tabela 1 – Estado nutricional e composição corporal das participantes da pesquisa. São Paulo, 2025
Estado nutricional |
X ± DP ou n (%) |
IMC |
|
Eutrofia |
25 (64,1) |
Sobrepeso |
11 (28,2) |
Obesidade |
03 (07,7) |
Composição corporal |
|
GC (%) |
32,5 ± 7,0 |
GC (kg) |
21,8 ± 8,0 |
Massa magra (kg) |
23,9 ± 3,1 |
*IMC = Índice de Massa Corporal; GC = gordura corporal
Observou-se que 64,1% (N=25) das participantes, apresentavam-se eutróficas segundo o IMC e 35,9% (N=14) estavam acima do peso. A média da porcentagem de gordura foi de 32,5% (±7), a média da gordura em quilogramas foi de 21,8 kg (±8) e a massa magra de 23,9kg (±3,1).
Na Tabela 2, é possível visualizar o consumo alimentar das mulheres, além da ingestão de água.
Tabela 2 - Consumo alimentar das participantes da pesquisa. São Paulo, 2025
Consumo alimentar |
± DP |
Carboidratos (% VET) |
42,9 ± 9,2 |
Proteínas (% VET) |
20,3 ± 8,1 |
Lipídeos (% VET) |
36,7 ± 8,0 |
Fibras (g) |
17,1 ± 7,5 |
Gordura saturada (g) |
25,9 ± 10,9 |
Gordura insaturada (g) |
27,8 ± 13,4 |
Vitamina E (mg) |
6,1 ± 2,3 |
Magnésio (mg) |
202,3 ± 90,9 |
Cálcio (mg) |
614,9 ± 423,9 |
Vitamina C (mg) |
82,8 ± 115,6 |
Vitamina A (mcg) |
467,8 ± 350 |
Ferro (mg) |
8,2 ± 2,7 |
Ingestão de água (L)* |
2,1 ± 0,7 |
*Ingestão de água de 34 mulheres.
Com relação ao consumo alimentar de carboidratos, em percentual do valor energético total (% do VET), verificou-se média de 42,9% do VET (±9,2), sendo considerado inadequado em relação as recomendações vigentes. Já a ingestão média de proteínas foi de 20,3% (±8,1), considerada adequada. Observou-se ingestão média elevada de lipídios (36,7%; ±8).
Quanto ao consumo de cálcio, as participantes da pesquisa consumiram em média 614,9mg (±423,9), deste mineral. Com relação a ingestão de ferro verificou-se média de ingestão de 8,2mg (±2,72).
Ao analisar o consumo de água, foi observada ingestão média de 2,1 (±0,7). Entretanto, 30,7% da amostra, apresentou um consumo de apenas 1 a 1,5L/dia. A menor ingestão de água foi observada nas mulheres obesas (Tabela 3) (1,5±0,5).
Na Tabela 3, pode-se observar o consumo alimentar das participantes de acordo com seu estado nutricional.
Tabela 3 - Consumo alimentar das participantes da pesquisa de acordo com o estado nutricional. São Paulo, 2025
Estado Nutricional |
|||
Consumo alimentar |
Eutrofia (n = 25) ± DP |
Sobrepeso (n =11) ± DP |
Obesidade (n =3) ± DP |
Carboidratos (%) |
42 ±9,8 |
44,4±7 |
44,4±13 |
Proteínas (%) |
21,5±7,5 |
19,3±9,9 |
13,6±1,5 |
Lipídeos (%) |
36,3±7,9 |
32,2±6,7 |
41,9±13,6 |
Fibras (g) |
16,1±7,9 |
18,9±6 |
18,9±9,6 |
Gordura saturada (g) |
26±9,5 |
26,2±15,2 |
23,2±3,1 |
Gordura insaturada (g) |
25,1±12,4 |
32,0±15 |
35±13,1 |
Vitamina E (mg) |
5,6±1,9 |
7,1±3 |
6,6±3,2 |
Magnésio (mg) |
188,8±94,1 |
233,8±84,9 |
199±83,8 |
Cálcio (mg) |
668,6±493,2 |
553,9±255,6 |
390,7±192,3 |
Vitamina C (mg) |
84,5±129,9 |
83±97,8 |
67,1±54,7 |
Vitamina A (mcg) |
434,5±326,2 |
580,5±416 |
332,3±273,4 |
Ferro (mg) |
7,7±2,5 |
8,7±2,8 |
9,8±3,2 |
Ingestão de água (L)* |
(n = 22) |
(n =9) |
(n =3) |
± DP |
± DP |
± DP |
|
2,1±0,7 |
2,2±0,6 |
1,5±0,5 |
*Ingestão de água de 34 mulheres.
Na Tabela 3 é possível sugerir um maior consumo de lipídios e menor ingestão de cálcio pelas participantes que foram classificadas como obesas.
O consumo de cálcio foi menor entre as mulheres com obesidade (390,7±192,3), Menores valores de consumo de ferro foram encontrados nas participantes eutróficas, 7,7mg (±2,5).
A Tabela 4, apresenta os critérios de diagnóstico para constipação intestinal funcional pelos critérios de ROME III e o tipo de consistência fecal, de acordo com a escala de Bristol das participantes do estudo.
Tabela 4 - Critérios de avaliação de constipação das participantes da pesquisa. São Paulo, 2025
Critérios |
X ± DP |
ROMA III |
|
Esforço |
36 (92,3) |
Fezes fragmentadas/endurecidas |
38 (97,4) |
Evacuação incompleta |
33 (84,6) |
Bloqueio anal |
26 (66,6) |
Uso das mãos |
06 (15,3) |
Escala de Bristol |
|
Tipo 1 |
06 (15,4) |
Tipo 2 |
19 (48,7) |
Tipo 3 |
09 (23,1) |
Tipo 4 |
05 (12,8) |
Acerca dos critérios de ROMA III, assinalados pelas participantes, a maioria das mulheres (97,4%; N=38) apresentava fezes fragmentadas ou endurecidas em pelo menos 25% das evacuações. O esforço ao evacuar e a evacuação incompleta foram observados em 92,3% (N=36) e 84,6% (N=33) das mulheres, respectivamente.
A constipação é um distúrbio no trato gastrointestinal determinado pela dificuldade e/ou rara eliminação das fezes. Sua etiologia é multifatorial e o hábito alimentar inadequado e o estado nutricional dos indivíduos têm sido considerados fatores de risco.
No presente estudo, 64,1% (N=25) das participantes com diagnóstico de constipação intestinal (CI), apresentavam-se eutróficas e 35,9% (N=14) estavam acima do peso, sendo a média da porcentagem de gordura de 32,5% (±7). Benjamim et. al. (2020), ao avaliarem pacientes obesos atendidos no ambulatório de nutrição no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco (HC - UFPE), observaram prevalência de constipação intestinal, determinada através dos critérios de Roma IV, de 33,7%, enquanto a CI autorreferida foi de 29,7%.
Silva et. al. (2025) ao avaliarem 97 mulheres, verificaram que o estado nutricional das participantes que relataram dois ou mais sintomas de constipação intestinal variou desde eutrofia até obesidade grau III, sendo que a maioria (31,0%; n = 30) estava com sobrepeso ou obesidade [13]. A obesidade ou o excesso de peso corporal pode contribuir para os sintomas intestinais. O estudo de Marques et. al. (2022) mostrou que a população feminina com sobrepeso e obesidade tem mais chances de desenvolver a disbiose intestinal, com sintomas de CI e distensão abdominal [14].
A obesidade está associada à constipação, mas ainda não é reconhecida como um fator causal da constipação. Um estudo recente mostrou que indivíduos obesos apresentam vários outros fatores de risco para constipação, como inatividade física, baixa qualidade da dieta com baixo consumo de fibras e vegetais em geral [15]
Quanto a alimentação, observou-se baixo consumo de carboidratos e elevada ingestão de lipídios (36,7% do VET) de acordo com as recomendações vigentes. Fernandes et. al. (2016), [16] ao investigarem a alimentação de mulheres atendidas em uma clínica escola de Nutrição, mostraram menores valores de consumo de gorduras (27,5% do VET) do que os do presente estudo.
Por meio do Inquérito Nacional de Alimentação da Pesquisa de Orçamento Familiar de 2008-2009, foi realizado um estudo sobre o consumo alimentar de adultos, e se observou média do consumo de carboidratos entre as mulheres de 55,8%, valores superiores aos verificados neste estudo [17].
A Sociedade Brasileira de Cardiologia (2013) [11] recomenda que a ingestão de gorduras saturadas seja menor que 10% do VET (Valor Energético Total), sendo que o consumo médio das mulheres desta pesquisa foi equivalente a 6,4%, estando próximo ao adequado. Quanto as gorduras insaturadas a recomendação é de 15% do VET e a média de consumo das participantes foi de 27,8 g (±13,4), o equivalente a 6,9% do VET, percentual próximo ao recomendado.
Estudo realizado com pacientes de uma UBS em Flores da Cunha, que buscou avaliar o consumo de gorduras saturadas, observou uma ingestão de 28,1 g entre as mulheres [18], dados próximos as participantes do presente estudo que ingeriram uma média de 25,9 g deste nutriente. Considerando o consumo de gorduras insaturadas, uma pesquisa feita com 250 estudantes, em que 61,6% eram mulheres, apontou que 97,4% consumiram valores abaixo do recomendado de gorduras monoinsaturadas e 99,4% de poli-insaturadas. No entanto, o consumo de gorduras saturadas estava acima da recomendação de consumo por 44,8% das estudantes [19].
Quanto ao consumo de micronutrientes, notou-se consumo insuficiente de cálcio e ferro pelas participantes da pesquisa. No estudo de Gomes et. al. (2021), [20] a ingestão média de cálcio das mulheres atendidas em uma clínica escola foi de 543 mg, e o consumo de ferro 8,76 mg. Ainda em semelhança aos resultados obtidos nesse estudo, pesquisa realizada por Araujo et. al. (2013) [17] mostrou uma ingestão de cálcio e ferro de 477 mg e 10,2 mg, respectivamente pelas mulheres avaliadas.
No que diz respeito as fibras alimentares, a recomendação varia entre 21 a 26 g/dia de acordo com a idade [10]. Verificou-se nas mulheres avaliadas um consumo médio de 17,2 g (±7,5); somente 28,2% das participantes (n=11) tiveram o consumo acima de 21 g/dia, sendo a maioria (71,8%) abaixo do recomendado, o que pode estar relacionado aos sintomas de constipação intestinal, considerando a importância do consumo de fibras dietéticas para a prevenção e tratamento deste quadro [18]. Em semelhança a esses resultados, pesquisa com adultos que frequentavam um supermercado de São Luís – Maranhão (n=133), dos quais 60,9% eram do sexo feminino, verificou que 38 delas apresentaram um consumo de fibras menor que 20 g, considerado inadequado [21]. Sandri et. al. (2012) [22] em sua pesquisa com mulheres acima de 50 anos, observaram que 16 apresentavam constipação, e tiveram um consumo médio de 20 g de fibras.
Machado e Capelari (2010) [23] ao avaliarem o grau de adesão e a eficácia da fibra dietética no tratamento da constipação intestinal funcional em um estudo clínico longitudinal, envolvendo 59 indivíduos, 54 mulheres e 5 homens, com idade média de 46 anos, concluíram que a eficácia da fibra dietética se mostrou moderada, ocorrendo benefício em 64% dos casos.
O consumo médio de água dos indivíduos foi de 2,1L/dia, sendo a menor ingestão observada nas mulheres obesas. Estudo realizado com adultos e idosos de uma clínica na Universidade Federal de Santa Maria, mostrou que 34,61% dos pacientes com IMC maior que 30kg/m2 ingeriam até 1,5L de água e somente 17,30% consumiam valores acima de 1,5L [24].
Silva et al (2020) [4] ao avaliarem pacientes de um hospital universitário verificaram que 13,2% dos constipados e 31,8% dos não constipados ingeriam mais que oito copos de por dia.
Viscki e Oliveira (2021), [25] evidenciaram em sua pesquisa com universitárias de Blumenau (SC), que 48% das mulheres, tiveram um consumo entre 1-2L/dia de água e somente 28% acima de 2L e a prevalência de constipação intestinal entre essas mulheres foi de 54%.
A literatura incentiva a ingestão de pelo menos 8 copos/dia de líquidos, incluindo sucos, água, entre outros, pois altera o peso e a maciez das fezes. Além disso, a ingestão hídrica elevada também se relaciona com o aumento do número de reflexos gastrocólicos e contribui para a lubrificação intestinal [5].
O cólon tem participação decisiva na manutenção do hábito intestinal normal. Sua motilidade é complexa e varia com a parte considerada. Embora ainda haja algumas controvérsias, em consequência das dificuldades de estudo da motilidade, existem várias evidências de que, no cólon ascendente, ocorram movimentos antiperistálticos, que seguram o conteúdo que passa a válvula ileocecal para o cólon direito. Marcadores radiológicos, ingeridos, aí permanecem por mais tempo do que seria esperado. O cólon sigmoide também é local que retarda o trânsito do conteúdo colônico. No cólon transverso e descendente, ocorrem contrações segmentares, que, lentamente, movimentam o conteúdo colônico em direção ao reto e em direção proximal. Esse movimento é frequentemente associado com a alimentação, como a presença de fibras, água, eletrólitos e restos alimentares [5].
No presente estudo a maioria das mulheres (97,4%) apresentou fezes fragmentadas ou endurecidas em pelo menos 25% das evacuações. O esforço ao evacuar e a evacuação incompleta também foram relatados por grande parte das participantes.
Estudo realizado com 50 estudantes do sexo feminino de Blumenau, mostrou que a sensação de evacuação incompleta e fezes endurecidas estava presente em 54% das participantes, e esforço ao evacuar (46%) e fezes fragmentadas ou endurecidas (30%) também foram relatadas pelas mulheres [25].
Pesquisa realizada com moradores de Pelotas – RS, demonstrou que o número de evacuações semanais inferiores a três estava presente em 42,5% das mulheres consideradas constipadas. A utilização de manobras manuais para facilitar a evacuação foi o critério menos citado pelas participantes (12,6%). O uso de laxantes foi referido por 22,4% das mulheres [26].
Baseando-se nos resultados obtidos no presente estudo, ressalta-se a importância de ações de orientação nutricional para ajustes no consumo alimentar e possível melhora do estado nutricional e no quadro de constipação intestinal da maior parte das participantes do estudo.
A presença de critérios indicativos de constipação intestinal nas participantes do presente estudo foi elevada, especialmente fezes fragmentadas ou endurecidas em pelo menos 25% das evacuações, esforço ao evacuar e evacuação incompleta. Além disso, a baixa ingestão média de fibras foi observada e consumo diário insuficiente de água para cerca de um terço das participantes do estudo.
Dessa maneira, observou-se uma necessidade de acompanhamento nutricional para que sejam priorizadas a educação nutricional e a melhora do consumo alimentar, juntamente com a melhora do estado nutricional e do quadro de constipação intestinal de grande parte das mulheres.
Conflitos de interesse
Os autores declaram não haver conflitos de interesse de qualquer natureza.
Fontes de financiamento
Financiamento próprio.
Contribuição dos autores
Concepção e desenho da pesquisa: Mendes W, Sousa LJ, Bazanelli AP, Pereira IRO, Viebig RF, Nacif M; Obtenção de dados: Mendes W, Sousa LJ, Bazanelli AP, Pereira IRO, Viebig RF, Nacif M; Análise e interpretação dos dados: Mendes W, Sousa LJ, Bazanelli AP, Pereira IRO, Viebig RF, Nacif M; Redação do manuscrito: Mendes W, Sousa LJ, Bazanelli AP, Pereira IRO, Viebig RF, Nacif M; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Mendes W, Sousa LJ, Bazanelli AP, Pereira IRO, Viebig RF, Nacif M.
Referências
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5. Fernandes ES, Blasi TC. Constipação intestinal relacionada com ingestão hídrica em mulheres. Disciplinarum Scientia. 2010; 11(1):53-60. https://doi.org/doi: 10.37777/966.
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