ARTIGO ORIGINAL
Estado nutricional e hábitos alimentares de crianças e adolescentes com síndrome de Down
Nutritional status and eating habits of children and adolescents with Down syndrome
Linda Inês Cardoso Barros1, Daniela Fortes Neves Ibiapina1, Daniele Rodrigues Carvalho Caldas1
1Centro Universitário Santo Agostinho (UNIFSA), Teresina, PI, Brasil
Recebido em: 10 de junho de 2024; Aceito em: 15 de julho de 2024.
Correspondência: Linda Inês Cardoso Barros, lindainescardosobarros@gmail.com
Como citar
Barros LIC, Ibiapina DFN, Caldas DRC. Estado nutricional e hábitos alimentares de crianças e adolescentes com síndrome de Down. Nutr Bras. 2024;23(2):841-851. doi:10.62827/nb.v23i2.3019
Introdução: A Síndrome de Down é uma condição genética determinada pela trissomia do cromossomo 21, o que caracteriza indivíduos com traços físicos e psicossociais próprios. A partir dos 2 anos de idade, com o aumento das chances de desenvolvimento de sobrepeso e obesidade, há preocupação com o surgimento de outras patologias e a redução da qualidade de vida dessa população. Objetivo: Analisar por meio da literatura o estado nutricional e os hábitos alimentares de crianças e adolescentes com Síndrome de Down. Métodos: Revisão integrativa da literatura, realizada através de pesquisa bibliográfica nos repositórios Unisales, Unoeste e UFGD e nas bases de dados Medline/PubMed e LILACS/Scielo com análise de 10 artigos em inglês e português publicados entre 2019 e abril de 2024. Resultados: Verificou-se prevalência de excesso de peso entre 15% (n=6) e 59,99% (n=9) na população estudada, um baixo consumo de frutas, legumes e carnes vermelhas e limitada prática de exercícios. Conclusão: Identificou-se pevalência de excesso de peso preocupante em crianças e adolescentes com Síndrome de Down, associada a ausência de aleitamento materno exclusivo, desenvolvimento de hábitos alimentares inadequados e limitada prática de exercício.
Palavras-chave: Síndrome de down; sobrepeso; obesidade; criança; adolescente.
Introduction: Down Syndrome is a genetic condition determined by trisomy 21, which characterizes individuals with their own physical and psychosocial traits. From the age of 2, with the increased chances of developing overweight and obesity, there is concern about the emergence of other pathologies and the reduction in the quality of life of this population. Objective: To analyze, through literature, the nutritional status and eating habits of children and adolescents with Down Syndrome. Methods: Integrative literature review, carried out through bibliographic research in the Unisales, Unoeste and UFGD repositories and in the Medline/PubMed and LILACS/Scielo databases with analysis of 10 articles in English and Portuguese published between 2019 and April 2024. Results: There was a prevalence of excess weight between 15% (n=6) and 59.99% (n=9) in the studied population, a low consumption of fruits, vegetables and red meat and limited exercise. Conclusion: A worrying prevalence of excess weight was identified in children and adolescents with Down Syndrome, associated with the lack of exclusive breastfeeding, development of inadequate eating habits and limited exercise.
Keywords: Down syndrome; overweight; obesity; child; adolescent.
A Síndrome de Down (SD) é uma condição genética caracterizada pela trissomia do cromossomo 21, o que resulta em indivíduos com traços físicos e psicossociais próprios [1]. No Brasil, entre os anos de 2020 e 2021, foram notificados 1.978 casos de nascidos com SD, com uma prevalência de 4,16 por 10 mil nascidos vivos no mesmo período [2].
Apesar das diferenças no padrão de crescimento entre crianças com SD e crianças sem SD, é possível apontar o crescimento nos índices de sobrepeso e obesidade para ambos os grupos [4][5]. Até 2019, 13,2% das crianças entre 5 e 9 anos apresentavam obesidade e 28% já tinha algum grau de excesso de peso [6]. Para crianças com SD esses valores são ainda mais prevalentes [7].
O aumento das chances de desenvolvimento de sobrepeso e obesidade em indivíduos com SD ocorre após os 2 anos de idade [7]. Antes disso, a dificuldade na amamentação e a introdução alimentar comprometida pelo desenvolvimento atrasado da dentição e pela hipotonia podem decorrer em desnutrição [4,8].
Os pais optam por alimentos que proporcionem facilidade de mastigação e deglutição, os quais possuem maior índice de aceitabilidade entre crianças com SD. A alternativa geralmente são os industrializados, fontes de açúcares e gorduras trans, enquanto frutas e verduras quase não aparecem na dieta [4].
Aliado a isso, se tem a reduzida prática de exercícios pelas crianças e adolescentes com trissomia. Tal condição tem suas bases traçadas pelas limitações físicas causadas por doenças respiratórias, redução da massa muscular e óssea, bem como luxação de articulações [9].
A diminuição na realização de atividades que proporcionem gasto energético predispõe abrandamento do desenvolvimento ósseo e aumento do risco de desenvolvimento de doenças como diabetes, hipertensão e dislipidemias na vida adulta, sendo assim, o exercício deve acontecer por meio de esportes adaptados à síndrome e com acompanhamento de forma a facilitar o estímulo à atividade e contribuindo para o processo de crescimento e desenvolvimento [10].
Dessa forma, este estudo objetivou analisar através da literatura atual o estado nutricional e os hábitos alimentares de crianças e adolescentes com Síndrome de Down, contribuindo com a propagação de informações que garantam uma melhor qualidade de vida para essa população.
Trata-se de uma revisão da literatura integrativa. A busca foi realizada através de pesquisa bibliográfica por meio dos repositórios da Unisales, Unoeste e UFGD e das bases de dados Medline, PubMed, LILACS e Scielo. Os artigos selecionados tinham como temática o estado nutricional e os hábitos alimentares de crianças e adolescentes com Síndrome de Down.
Foram incluídos estudos realizados com amostra de crianças e adolescentes na faixa etária de 2 meses a 20 anos de idade, de ambos os sexos e que apresentavam Trissomia 21, publicados entre janeiro de 2019 e abril de 2024, em português e inglês. Artigos de revisão da literatura, que não contemplavam a temática em questão, incompletos, publicados no período anterior a 2019 ou que eram pagos, foram excluídos da pesquisa. A seleção dos artigos encontrados partiu da leitura prévia dos títulos dos artigos, seguida da leitura de seus resumos e posterior análise detalhada do que contemplavam a temática em estudo.
Os descritores utilizados, segundo o Medical Subject Heading (MeSH), foram: “Down Syndrome”, “nutrition”, “overweight”, “child” e “adolecent” interligados por meio do conector booleano “AND”.
402 crianças e adolescentes na faixa etária dos 2 meses aos 20 anos de idade fazem parte dos estudos selecionados. Quanto ao país de origem dos partícipes da pesquisa, foram encontradas pesquisas com brasileiros (6), sauditas (1), paquistaneses (1), emiradenses (1), poloneses (1).
Esquematicamente, os artigos selecionados foram organizados segundo o autor e ano de publicação, o título, a amostra e o tipo de estudo, a metodologia, os objetivos e a conclusão
(Quadro 01).
Quadro 01 – Dados de 10 estudos sobre predominância de excesso de peso e hábitos alimentares de crianças e adolescentes com Síndrome de Down
Autor/Ano |
Título |
Amostra/Tipo de estudo |
Objetivo |
Conclusão |
Pedroni, G; Paixão, M. (2023) [24] |
Estado Nutricional e Hábitos Alimentares de Crianças e Adolescentes com Síndrome de Down |
Estudo descritivo transversal (n=44) |
Avaliar o estado nutricional de crianças e adolescentes com diagnóstico de Síndrome de Down relacionando-o as suas preferencias alimentares. |
Observou-se incidência de 9,1% de obesidade, 13,5% de sobrepeso e 18,2% doenças cardiovasculares. Quanto aos hábitos alimentares, a grande maioria alimentava-se de forma balanceada, com prevalência de alimentos in natura ou minimamente processados na dieta. |
Trombim; et al. (2022) [22] |
Comportamento Alimentar e Estado Nutricional de Crianças e Adolescentes Portadores de Síndrome de Down |
Estudo transversal descritivo (n=29) |
Avaliar o comportamento alimentar e o estado nutricional de crianças e adolescentes portadores da Síndrome de Down através do Questionário do Comportamento Alimentar da Criança (CEBQ). |
Evidenciou-se que 50% e 12% das crianças e adolescentes respectivamente apresentaram excesso de peso. O CEBQ aponta maior pontuação na subescala “seletividade”, representativo de indivíduos com preferências por alimentos industrializados ricos em sódio, gorduras, aditivos e açúcares. |
Wernio; et al. (2022) [11] |
Analysis of eating habits and nutritional status of children With Down Syndrome in the context of lipid parameters and oxidative stress |
Não referenciado (n=39) |
Avaliar o estado nutricional de crianças com trissomia 21 e determinar suas escolhas nutricionais e comportamento no contexto de sua composição corporal, bem como marcadores lipídicos e de estresse oxidativo. |
27% dos meninos e 46% das meninas apresentaram sobrepeso. Observou-se distúrbios nos parâmetros lipídicos e de estresse oxidativo, bem como hábitos alimentares anormais em todas as crianças com SD, independente do seu estado nutricional. |
Daniel; et al. (2021) [21] |
Avaliação do Estado Nutricional e da Dieta de Crianças e Adolescentes com Síndrome de Down |
Estudo clínico descritivo transversal (n=37) |
Avaliar a adequação dos componentes da dieta e o estado nutricional de crianças e adolescentes com Síndrome de Down em seguimento ambulatorial em um serviço de saúde de referência. |
A dieta com excesso de calorias, carboidratos e lipídios, como também com déficit de fibras, aponta uma alimentação pouco balanceada entre crianças e adolescentes com SD, principalmente após o primeiro ano de vida. |
Bindayel, Iman A.; (2021) [25] |
Relationship between Down Syndrome (DS) and Obesity in Children and Adolescents and its Relation to Dietary and Lifestyle Factors |
Estudo de caso-controle (n=48) |
Avaliar o status de sobrepeso e obesidade em crianças e adolescentes matriculados em dois centros especializados em Síndrome de Down localizados em Riad e os compara com irmãos saudáveis, de mesma faixa etária. |
Não foi observada diferença no estado nutricional entre os grupos com SD e seus irmãos, exceto algumas diferenças nas refeições, frequência dos grupos alimentares ou hábitos alimentares. |
Ribeiro; et al. (2019) [17] |
Estado Nutricional, Percentual de Gordura e Aspectos Dietéticos de Crianças e Adolescentes com Síndrome de Down |
Estudo transversal descritivo (n=15) |
Avaliar a composição corporal e aspectos dietéticos de portadores de Síndrome de Down, entre 5 e 18 anos de idade. |
A obesidade das crianças e adolescentes sindrômicas não esteve relacionada somente a alteração cromossômica, mas também ao hábito alimentar que eles podem possuir. |
Chaudhary, A.; (2019) [26] |
Relationship between dietary intake and prevalence of obesity in children with down’s syndrome |
Não referenciado (n=46) |
Avaliar práticas alimentares observadas e o desenvolvimento da obesidade em crianças com Síndrome de Down para que seja estabelecida uma relação entre as duas variáveis. |
A ingestão energética e as escolhas alimentares foram uma das principais razões para a prevalência da obesidade em crianças com SD. |
Santos, J. P.; Fernandes, C. A.; (2019) [20] |
Atenção à Saúde de Pessoas com Síndrome de Down na Educação Escolar: Estudo de Proposta para Práticas Corporais |
Pesquisa descritiva (n=23) |
Analisar indicadores de obesidade geral e central de pessoas com trissomia 21, matriculadas em uma escola que atende na modalidade de educação especial e apresentar possíveis práticas corporais presentes na literatura. |
27,27% dos indivíduos menores de 18 anos estavam acima do peso, sendo que a prática de exercício aeróbico e resistido promoveram alterações na composição corporal. |
Osaili; et al. (2019) [23] |
Physical Status and Parent-Child Feeding Behaviours in Children and Adolescents with Down Syndrome in The United Arab Emirates |
Estudo transversal (n=83) |
Determinar o estado físico, problemas alimentares, relação alimentar entre pais e filhos e resultado de peso em crianças e adolescentes com Síndrome de Down nos Emirados Árabes Unidos. |
Houve prevalência de EP de 20,6%. O STEP-CHILD apontou: seletividade alimentar (62,2%), continuar comendo na presença de alimentos (57,7%) e engolir sem mastigar o suficiente (50%). |
Rodrigues; et al. (2019) [27] |
Educação Física Escolar Aliada a Prevenção da Obesidade em Pessoas com Síndrome de Down |
Não referenciado (n=10) |
Contribuir, identificar e analisar a importância da Disciplina de Educação Física na Idade Escolar na prevenção da Obesidade em pessoas com Síndrome de Down. |
Identificou-se a necessidade de novos estudos a fim de contribuir e melhorar a alimentação e os hábitos alimentares de pessoas com Síndrome de Down. |
Fonte: Autores da pesquisa, 2024
A trissomia 21 está intimamente relacionada a maiores taxas de sobrepeso e obesidade em crianças e adolescentes, estando presente na faixa de 15% (n=6) a 59,99% (n=9) dos participantes dos estudos analisados. Através do indicador Índice de Massa Corporal (IMC) a literatura corrobora com tal argumento. Em pesquisa com 39 pacientes, Wernio et al. [11] constataram que 15% (n=6) da amostra apresentava obesidade e 23% (n=9) estava acima do peso. Algo semelhante foi registrado por Santos e Fernandes [20], onde 27,27% (n=3) dos indivíduos com T21 com menos de 18 anos estavam acima do peso. Ribeiro et al. [17], por sua vez, encontraram em amostra de 15 crianças e adolescentes, prevalência de 59,99% (n=9) de excesso de peso, sendo que dessas, 26,66% (n=5) tinham sobrepeso e 33,33% (n=6) obesidade. Quando comparados com valores de excesso de peso em crianças sem T21 (11-38%), observa-se maior prevalência de sobrepeso e obesidade entre portadores da síndrome [12].
Indivíduos com SD já nascem com maior predisposição à cardiopatias, independente da elevação dos níveis de gordura central, isso porque podem apresentar malformações congênitas do coração [20]. Wernio et al. [11] identificaram que de 39 pacientes, 49% (n=19) realizaram pelo menos uma operação cardíaca no primeiro ano de vida, 21% (n=8) possuíam defeito septal e 36% (n=14) apresentaram defeito no canal atrioventricular, situações que culminam em insuficiência cardíaca e podem levar a morte do recém-nascidos [13].
Fisiologicamente, os recém-nascidos com SD apresentam características morfológicas que dificultam os processos de sucção e deglutição do leite materno, como a diminuição generalizada do tônus muscular, disfagia e alterações anatômicas orofaciais, a exemplo da língua protusa, respiração bucal, anomalias dentárias, dentre outras [14].
Quando não estimulada adequadamente, essas limitações, em consonância com a seletividade alimentar, podem ser limitantes da independência da criança a longo prazo, o que envolve a capacidade de brincar e o comer [18]. Pedroni e Paixão [24] observaram em sua pesquisa que 9,1% (n=4) das crianças tinham dificuldade para engolir, 20,5% (n=9) ficavam com a boca aberta, 9,1% (n=4) mantinham a língua para fora da boca, 15,9% (n=7) tinham dificuldade de mastigação e 6,8% (n=3) apresentavam sialorreia, condições que dificultam o processo alimentar.
A alimentação adequada é uma ferramenta indispensável para a garantia de saúde em todas as fases da vida, especialmente na infância. O Aleitamento Materno Exclusivo (AME) até os seis meses de idade e a introdução alimentar planejada fornecem suporte duradouro por toda a vida do indivíduo, prevenindo o surgimento de doenças crônicas. O leite materno como primeiro alimento, muito além de nutrir, é um veículo de afeto entre mãe e filho, além de proporcionar estímulos sensórias e musculares na criança com SD. Hoje, conhecidamente, os benefícios do leite materno se estendem para além da primeira infância, sendo essencial na prevenção da obesidade [16,17].
O cenário de AME é promissor, no entanto, é uma realidade distante para mães de crianças com T21, como sugere o trabalho de Daniel et al. [21], onde a média de AME foi de 56,75% (n=21). Os recém-nascidos com SD muitas vezes precisam passar por internações subsequentes, o que cria um ciclo de amamentação desregular. Tal situação pode explicar os altos índices de desnutrição antes dos dois anos de vida nessa população, seguido do aumento do peso após os dois anos de idade [4]. Os autores supracitados também registraram que 51,35% (n=19) passaram por internação neonatal e desses 21,62% (n=8) tinham baixo peso dentro os 37 participantes.
A Introdução Alimentar após os seis meses é outro desafio, visto que crianças com SD possuem maior seletividade alimentar. A independência das crianças deve ser estimulada, contudo, cabe aos pais a oferta de alimentos saudáveis [17]. Osaili et al. [23] referem que em uma amostra de 83 indivíduos entre 2 e 19 anos, 62,2% (n=51) tinham seletividade alimentar. Dentre as preferências alimentares, Ribeiro et al. [17] observaram correlação moderada a forte entre excesso de peso e o consumo de óleo/azeite (0,71), pão/biscoito (0,69) e líquidos com açúcar (0,71) e correlação negativa entre excesso de peso e ingestão de frutas (0,78) e legumes/verduras (0,73), reforçando referências na literatura que sugerem alto consumo de açúcares e gorduras saturadas e o baixo consumo de fibras alimentares, o que favorece constipação nesse grupo [4,17].
Quando comparada a ingestão alimentar de crianças e adolescentes com Síndrome de Down com a de seus irmãos sem SD, Bindayel [25] percebeu maior predomínio na realização das refeições diárias pelo primeiro grupo em relação ao segundo. Constatou-se, assim, que 82% (n=14) das crianças com SD realizavam o desjejum semanalmente, enquanto apenas 59% (n=10) de seus irmãos o faziam; 82% (n=14) referiram fazer o almoço sete vezes por semana, valor que se repetiu para os irmãos; 59% (n=10) dos portadores de T21 jantavam todos os dias, enquanto 76% (n=13) dos irmãos o faziam. Os números foram ainda mais positivos para adolescentes, onde 90% (n=18) realizavam desjejum, 95% (n=19) almoçavam e 80% (n=16) jantavam setes vezes por semana. Ao contrário do que se poderia esperar, os irmãos sem SD tiveram percentuais baixos de ingestão das refeições: somente 64% (n=13) realizavam desjejum e almoçavam e 55% (n=11) jantavam semanalmente, o que se justifica pelo maior acompanhamento dos pais na dieta dos filhos com SD, mesmo após a infância [25].
Ainda segundo o autor, 35% (n=6) das crianças consumiam carne ao longo da semana, 12% (n=2) consumiam vegetais e 6% (n=1) ingeriam frutas, valores um pouco abaixo dos encontrados para seus irmãos que foram, respectivamente, de 53% (n=9), 35% (n=6) e 17% (n=3). Os adolescentes demonstraram melhor ingestão, indicando redução da seletividade alimentar ao longo do desenvolvimento. Desses, 69% (n=14) consumiam carne vermelha sete vezes por semana, 20% (n=4) ingeriam frutas no período e 45% (n=9) legumes. Seus irmãos, ao contrário, mostraram menor consumo, com ingesta de 55% (n=11) de carne vermelha, apenas 9% (n=2) de frutas e 10% (n=2) de legumes.
Em consequência de diferenças anatômicas e fisiológicas, como membros mais curtos em relação ao tronco, ligamento e frouxidão de articulações, hipotonia e até mesmo problemas cardíacos, muitas crianças e adolescentes com SD encontram limitações na realização de movimentos [17,19]. Dentre as pesquisas exploradas, foi prevalente a limitada prática de atividade física entre as crianças e adolescentes com Síndrome de Down. Dados de Bindayel [25] sugerem que não chega à metade as crianças com SD que realizam atividades com frequência, dentre essas 13% (n=3) andavam regulamente, 43% (n=10) subiam escadas, 30% (n=7) faziam exercícios regulares, 13% (n=3) jogavam futebol e 13% (n=3) realizam atividades domésticas. Os adolescentes com SD demonstraram valores mais positivos para as mesmas atividades, com exceção dos afazeres domésticos. 43% (n=3) andavam regulamente, 57% (n=4) subiam escadas, 43% (n=3) realizavam exercícios regulares, 43% (n=3) jogavam futebol, 17% (n=1) nadavam. A estimulação da criança com Trissomia 21 deve ser iniciada de forma precoce e mantida ao longo de toda a vida, sempre com o devido acompanhamento profissional, pois além de garantir melhor resistência física, contribui para manutenção do peso corporal [18,27].
Identificou-se com essa revisão de literatura uma alta prevalência de excesso de peso em crianças e adolescentes com Síndrome de Down, bem como suas causas multifatoriais, dentre as quais estão as fisiológicas, anatômicas e comportamentais como a pega mamária deficitária, a dificuldade de sucção, a seletividade alimentar, sedentarismo e o baixo índice de Aleitamento Materno Exclusivo (AME).
Existe escassez de pesquisas que abordem a associação entre o excesso de peso e hábitos alimentares inadequados nesse público, bem como a utilização de mostras relativamente pequenas, limitações que reforçam a importância de novos estudos que abordem a necessidade do acompanhamento multiprofissional desde os primeiros meses de vida para indivíduos com Trissomia 21 como forma de prevenção do excesso e melhoria da sua qualidade de vida.
Conflitos de interesse
Os autores declaram não haver conflitos de interesse de qualquer natureza.
Fontes de financiamento
Financiamento próprio.
Contribuição dos autores
Concepção e desenho da pesquisa: Barros LIC, Ibiapina DFN, Caldas DRC; Coleta de dados: Barros LIC, Ibiapina DFN, Caldas DRC; Análise e interpretação dos dados: Barros LIC, Ibiapina DFN, Caldas DRC; Redação do manuscrito: Barros LIC, Ibiapina DFN, Caldas DRC; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Barros LIC, Ibiapina DFN, Caldas DRC.
Referências
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