REVISÃO
Desafios da assistência de enfermagem nos serviços de emergência hospitalar: revisão integrativa
Eduarda Nicolly dos Santos Sousa1, Paloma Santos Alencar Sousa1, Lorran Cipriano de Sousa1, Indira Camilly Esmero Carvalho e Silva1, Weslania de Carvalho Paixão1, Lairton Batista de Oliveira1, Francisco Gilberto Fernandes Pereira1
1Universidade Federal do Piauí (UFPI), Teresina, PI, Brasil
Recebido: 15 de agosto de 2024, Aceito: 16 de agosto de 2024.
Correspondência: Francisco Gilberto Fernandes Pereira, profgilberto@ufpi.edu.br
Como citar
Sousa ENS, Sousa PSA, Sousa LC, Silva ICEC, Paixão WC, Oliveira LB, Pereira FGF. Desafios da assistência de enfermagem nos serviços de emergência hospitalar: revisão integrativa. Enferm Bras. 2024;23(4):1893-1905. doi:10.62827/eb.v23i4.4021
Objetivo: Mapear na literatura os desafios enfrentados pelos profissionais de enfermagem na prestação da assistência nos serviços de emergência. Métodos: Trata-se de uma revisão integrativa, com busca nas bases de dados: Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE), via PUBMED, Scientific Electronic Library Online (SCIELO), Excerpta Medica dataBASE (EMBASE) e SCOPUS, combinando descritores em português e inglês. Foram incluídos artigos originais, em todos os idiomas, publicados entre 2014 e 2024. Excluíram-se os trabalhos duplicados, de acesso pago, e os que não respondiam à pergunta norteadora. Foram encontrados 459 artigos. Resultados: A amostra final contemplou 13 artigos, os quais foram majoritariamente do ano de 2024, produzidos no continente asiático. A maioria dos enfermeiros participantes das pesquisas possuía apenas formação de graduação e não tinha treinamento especializado em enfermagem de emergência ou trauma. Os desafios suscitados podem ser divididos em duas áreas, no campo da gestão do serviço e estrutura: superlotação de emergência, escassez de recursos materiais, ausência ou inadequação de normas, fluxos e rotinas, que contribui para a fragilização da equipe; e, no campo da força de trabalho: o estresse ocasionado devido à necessidade de enfrentar situações imprevisíveis e complexas que exigem a rápida tomada de decisões; a preparação insuficiente e a falta de treinamento especializado, como também as situações de violência e abuso verbal de parentes e/ou acompanhantes. Conclusão: Os desafios a serem enfrentados pelos profissionais de enfermagem são complexos, multifatoriais e podem afetar à qualidade da assistência prestada aos pacientes.
Palavras-chave: Enfermagem em emergência; cuidados de enfermagem; serviço hospitalar de emergência.
Challenges of nursing care in hospital emergency services: integrative review
Objective: To map in the literature the challenges faced by nursing professionals in providing care in emergency services. Methods: This is an integrative review, with searches conducted in the following databases: Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE), via PUBMED, Scientific Electronic Library Online (SCIELO), Excerpta Medica dataBASE (EMBASE) and SCOPUS. Combinations of descriptors in Portuguese and English were used. Original articles were included, in all languages, published between 2014 and 2024. Duplicate articles, those with paid access and those that did not answer the guiding question were excluded. A total of 459 articles were found. Results: The final sample included 13 articles, most of which were from the year 2024 and were produced on the Asian continent. Most of the nurses participating in the research had only undergraduate training and no specialised training in emergency or trauma nursing. The challenges raised can be divided into two areas: in the field of service management and structure: emergency room overcrowding, shortage of material resources, absence or inadequacy of standards, flows and routines, which contributes to the weakening of the team; and in the field of the workforce: stress caused by the need to deal with unpredictable and complex situations that require rapid decision-making; insufficient preparation and lack of specialised training, as well as situations of violence and verbal abuse from relatives and/or companions. Conclusion: The challenges faced by nursing professionals are complex, multifactorial and may be related to the quality of care provided to patients.
Keywords: Emergency nursing; nursing care; emergency servisse hospital.
Desafíos de la asistencia de enfermería en los servicios de emergencia hospitalarios: revisión integrativa
Objetivo: Mapear en la literatura los desafíos enfrentados por los profesionales de enfermería en la prestación de atención en los servicios de emergencia. Métodos: Se trata de una revisión integrativa, con búsquedas realizadas en las siguientes bases de datos: Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE), a través de PUBMED, Scientific Electronic Library Online (SCIELO), Excerpta Medica dataBASE (EMBASE) y SCOPUS. Se utilizaron combinaciones de descriptores en portugués e inglés. Se incluyeron artículos originales en todos los idiomas, publicados entre 2014 y 2024. Se excluyeron los trabajos duplicados, de acceso pago y aquellos que no respondían a la pregunta orientadora. Se encontraron un total de 459 artículos. Resultados: La muestra final incluyó 13 artículos, la mayoría del año 2024, producidos en el continente asiático. La mayoría de los enfermeros participantes en los estudios tenían solo formación de pregrado y carecían de capacitación especializada en enfermería de emergencia o trauma. Los desafíos identificados pueden dividirse en dos áreas: en el campo de la gestión del servicio y la estructura, incluyendo la sobrecarga de emergencias, la escasez de recursos materiales, la ausencia o inadecuación de normativas, flujos y rutinas, que contribuyen al debilitamiento del equipo; y en el campo de la fuerza laboral, incluyendo el estrés causado por la necesidad de enfrentar situaciones impredecibles y complejas que requieren una rápida toma de decisiones; preparación insuficiente y falta de capacitación especializada, así como situaciones de violencia y abuso verbal de familiares y/o acompañantes. Conclusión: Los desafíos enfrentados por los profesionales de enfermería son complejos, multifactoriales y pueden estar relacionados con la calidad de la atención brindada a los pacientes.
Palabras-clave: Enfermería de emergencia; cuidados de enfermería; servicio de urgencia em hospital.
As atividades hospitalares de urgência e emergência possuem características próprias que moldam a organização do trabalho. A unidade de emergência é reconhecida como um dos ambientes mais estressantes, pois refere-se ao local que se presta atendimento ao paciente em situação de risco imediato. Assim atribui-se ao termo “urgência”, a ocorrência repentina de agravo à saúde com ou sem risco possível de morte, exigindo assistência médica sem tanta imediatidade. Já a “emergência” envolve situações que impliquem em risco iminente de morte ou sofrimento intenso. Diante disso, devido à natureza das ações realizadas nesse setor, ele apresenta características que geram altos níveis de estresse entre os profissionais [1].
No Brasil, o cenário dos serviços de urgência e emergência apresenta elevado índice de morbimortalidade devido, principalmente, à natureza dos agravos, sendo a violência e os acidentes de trânsito os de maior impacto. O reflexo disso são altas taxas de ocupação que, na ausência de um processo organizacional e assistencial bem estabelecido, podem culminar em sobrecarga nos trabalhadores e impactar negativamente na qualidade da assistência prestada e na segurança dos usuários [2].
Ainda, a enfermagem no âmbito da emergência exige que o enfermeiro tenha um olhar crítico-situacional e faça escolhas que beneficiem o paciente sem colocar em risco os profissionais assistenciais que oferecem o cuidado direto. Esse processo envolve o melhor uso de materiais, equipamentos, estrutura e trabalho em equipe [3].
Dessa forma, em situações críticas, a equipe de enfermagem se expõe de forma frequente a um conjunto complexo de demandas e responsabilidades, visto a exigência imediata de decisões, sendo ela a responsável por garantir os cuidados necessários às vítimas, enfrentando desafios constantes, num contexto de ação rápida e recursos limitados. E, em determinadas situações, acabam tendo que lidar com dilemas éticos e clínicos complexos, onde precisam manter a calma e assistir ao paciente com as intervenções adequadas [4,5,6].
Consequentemente, os desafios vivenciados nessas condições podem gerar sobrecargas que prejudicam a saúde mental dos profissionais, podendo levar à desistência do trabalho nesses setores específicos, apesar do apreço pela profissão [5].
Sendo assim, esta pesquisa justifica-se pela necessidade de fomentar a discussão acerca das principais dificuldades enfrentadas na assistência de enfermagem nos serviços de emergência. Dessa maneira, torna-se imperativo a realização de estudos a respeito desta temática, uma vez que o envolvimento dos enfermeiros na assistência frente aos pacientes em situação de urgências e emergências é determinante para os desfechos alcançados.
Com isso, para nortear esta pesquisa, elaborou-se a seguinte pergunta: “Quais são as barreiras encontradas na assistência de enfermagem nos serviços de emergência hospitalar?”. Dessa forma, o objetivo foi identificar as barreiras que dificultam a assistência de enfermagem nos serviços de emergência hospitalar.
Trata-se de uma Revisão Integrativa que compreendeu as seguintes etapas: 1. Identificação do tema e questão de pesquisa; 2. Estabelecimento de critérios para inclusão e exclusão de estudos/amostragem ou busca na literatura; 3. Definição das informações a serem extraídas dos estudos selecionados/categorização dos estudos, 5. Avaliação dos estudos incluídos na revisão integrativa; 6. Interpretação dos resultados; e 7. Apresentação da revisão/síntese do conhecimento [7].
Na identificação do tema e da questão de pesquisa, utilizou-se a estratégia PICo: sendo P (população – profissionais de enfermagem), I (fenômeno de interesse – barreiras que dificultam a assistência de enfermagem) e Co (contexto do estudo – serviços de emergência hospitalar). A partir desse conceito, a seguinte questão norteadora foi elaborada: “Quais são as barreiras que dificultam a assistência de enfermagem nos serviços de emergência hospitalar?”.
Em sequência, durante o período de abril a junho de 2024, realizou-se a busca nas seguintes bases de dados com abrangência internacional: Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE); Scientific Electronic Library Online (SCIELO); Excerpta Medica dataBASE (EMBASE); e SCOPUS. Na formulação da estratégia de busca, descritores bem delimitados e específicos foram usados para cada base, de modo a aumentar a sensibilidade na busca dos artigos (Quadro 1).
Quadro 1 – Estratégias de busca nos bancos de dados. Picos, PI, Brasil, 2024
Base de dados |
Estratégia |
SCIELO |
((emergency medical services) OR (hospital care) OR (ti:(emergency service hospital)) AND (nursing care) OR (emergency nursing)) |
SCOPUS |
((((((emergency medical services[Abstract]) OR (Hospital Care[Abstract])) OR (emergency service hospital[Article Title]))) AND (nursing care[Abstract])) OR (Emergency Nursing[Keywords])) AND ((“2014/01/01”[Date - Publication] : “2024/06/13”[Date - Publication])) |
EMBASE |
((‘hospital care’:ab,ti OR ‘emergency service hospital’:ab,ti OR ‘emergency medical services’:ab,ti) AND ‘nursing care’:ab,ti OR ‘emergency nursing’:ab,ti) AND ([meta analysis]/lim OR [controlled clinical trial]/lim OR [randomized controlled trial]/lim) AND [2014-2024]/py |
MEDLINE |
((((((emergency medical services[Title/Abstract]) OR (Hospital Care[Title/Abstract])) OR (emergency service hospital[Title]))) AND (nursing care[Title/Abstract])) OR (Emergency Nursing[Title/Abstract])) AND ((“2014/01/01”[Date - Publication] : “2024/06/13”[Date - Publication])) |
Fonte: Autores
Como critérios de inclusão, adotaram-se: artigos originais, disponíveis gratuitamente na íntegra, em todos os idiomas, publicados entre os anos de 2014 a 2024 nas bases de dados supracitadas. Foram excluídos os trabalhos duplicados, não pertencentes à área de enfermagem, teses, dissertações, artigos de opinião, livros, revisões, e artigos que não respondiam à pergunta norteadora.
Para classificação do material foi realizada leitura analítica dos artigos na íntegra e preenchido um instrumento que permitiu obter informações como: identificação (autor, ano e país), objetivos e barreiras encontradas quanto à assistência de enfermagem no serviço de emergência hospitalar. Realizou-se, ainda, a classificação os estudos quanto ao nível de evidência da Agency for Healthcare Research and Quality (AHRQ): nível I, meta-análise de múltiplos ensaios clínicos controlados e randomizados; nível II, estudos individuais com delineamento experimental; nível III, estudos quase experimentais; nível IV, estudos descritivos (não experimentais) ou de abordagem qualitativa; nível V, relatos de caso ou experiência; e por fim o nível VI, opiniões de especialistas [8].
Os resultados estão apresentados descritivamente em forma de quadro e a análise se processou de forma descritiva com apoio na literatura concernente às tendências e prioridades da pesquisa em enfermagem, bem como de reflexões e críticas dos autores.
Inicialmente, foram identificados 459 artigos, sendo 23 na EMBASE, 11 na SCIELO, 296 na PUBMED, e 129 na SCOPUS. Do total de artigos encontrados, foram excluídos 446, sendo 3 duplicados. Após a leitura dos títulos e resumos, como também, da aplicação dos critérios de inclusão e exclusão pré-estabelecidos, 41 artigos foram pré-selecionados. Por fim, depois de ser efetuada a leitura na íntegra dos artigos pré-selecionados, 13 estudos foram selecionados para formar a amostra final, os quais foram majoritariamente do ano 2024, produzidos no continente asiático. O fluxograma da seleção dos estudos que foram utilizados para desenvolvimento desta revisão pode ser visualizado da figura 1.
Fonte: Autores
Figura 1 – Fluxograma PRISMA da revisão integrativa. Picos, PI, Brasil, 2024
O Quadro 2 destaca as características dos artigos. Nota-se que, grande parte dos artigos utilizados são dos anos de 2017 a 2021 e, dentre os estudos selecionados, 2024 foi o ano com mais publicações (3), O NE que se sobressaiu entre os demais foi o IV (12 artigos). Ademais, os estudos derivam dos mais diversos continentes, sendo eles: Europa (Reino Unido), América (Estados Unidos e Brasil), África (Kenya, Gana e Serra Leoa) e Ásia (Brunei, China e Coreia do Sul).
Dentre as barreiras encontradas, as mais significativas foram relacionadas a falhas de gestão e estrutura, como a falta de fluxos e rotinas adequadas, a comunicação ineficaz entre a equipe multidisciplinar, a ausência de escuta ativa e motivação pela parte administradora, bem como o fornecimento inadequado de insumos necessários. Ademais, no campo da força de trabalho, destacaram-se a carência de estratégias de capacitação contínua, as jornadas de trabalho exaustivas, o abuso verbal sofrido pelos enfermeiros e o conflito entre o cuidado contínuo e a emergência, sendo todos esses fatores, empecilhos que dificultam a prestação de cuidados de enfermagem nos serviços de emergência.
Quadro 2 - Síntese dos estudos incluídos na revisão. Picos, PI, Brasil, 2024
Autor / Ano / País |
Nível de Evidência |
Local da pesquisa |
Objetivo do estudo |
Barreiras identificadas |
Benjamin, 2024 (EUA) [9] |
IV |
Quatro departamentos de emergência no nordeste dos Estados Unidos. |
Descrever como os enfermeiros de emergência controlam o fluxo de pacientes. |
Dados imprecisos, métodos não confiáveis para avaliar a carga de trabalho de enfermagem, falta de suprimentos e equipamentos disponíveis e funcionais, níveis de pessoal flutuantes, e mau trabalho de equipe. |
Wu et al., 2024 (China) [10] |
IV |
65 departamentos de emergência na China. |
Aumentar o nível de alfabetização informacional da equipe de enfermagem do departamento de emergência e investigar se existem diferentes grupos de alfabetização informacional em enfermeiros do departamento de emergência. |
Necessidade de alto nível de alfabetização informacional dos enfermeiros para coletar, analisar e aplicar informações de forma eficaz devido à urgência e complexidade do trabalho de enfermagem de emergência. |
Oh; Jung, 2024 (Coreia do Sul) [11] |
IV |
20 hospitais na Coreia do Sul. |
Analisar os múltiplos efeitos mediadores da competência de triagem percebida e das habilidades de raciocínio clínico entre profissionais. |
Baixo nível de proficiência e competência na triagem, além da necessidade de aprimoramento das habilidades de raciocínio clínico. |
Karikari et al., 2023 (Gana) [12] |
IV |
Hospitais distritais na região de Ashanti, Gana. |
Determinar o nível de conhecimento dos enfermeiros em gestão de emergências. |
Baixo nível de conhecimento dos enfermeiros que trabalham em unidades de emergência. |
Mass et al., 2022 (Brasil) [13] |
IV |
Dois setores de urgência e emergência do Sul do Brasil |
Conhecer as percepções dos profissionais de enfermagem de serviços de urgência e emergência quanto às cargas de trabalho e a relação com sua saúde. |
Altas cargas de trabalho que geram sobrecarga e risco de adoecimento psíquico dos enfermeiros. |
Ndung’u et al., 2022 (Kenya) [14] |
IV |
Duas Unidades de emergência em hospitais de referência em Nairobi, no Quênia. |
Destacar as necessidades educacionais específicas para enfermeiros que trabalham em dois departamentos de emergência em Nairobi, Quênia. |
Baixos níveis de competência, habilidades e conhecimento entre a maioria das enfermeiras de emergência. |
Agani et al., 2021 (Reino Unido) [15] |
IV |
Unidade de emergência de um hospital de referência no município de Ho. |
Explorar os desafios encontrados pelos enfermeiros que trabalham na unidade de emergência de um hospital secundário. |
Superlotação, falta de profissionais, falta de equipamentos e falta de apoio da gestão. |
Silva et al., 2020 (Brasil) [16] |
IV |
Unidades de emergência intra-hospitalar nos hospitais municipais de Ermelino Matarazzo e Itaquera. |
Analisar a presença, intensidade e fatores relacionados às condições de trabalho para sintomatologia depressiva em enfermeiros do setor intra-hospitalar de emergência da zona leste Paulista. |
Alta frequência de sintomatologia depressiva relacionada a condições de trabalho precarizadas com constante sobrecarga. |
Albuquerque et al., 2019 (Brasil) [17] |
IV |
Hospital público especializado em urgência e emergência na cidade de Maceió. |
Analisar a empatia dos profissionais de enfermagem que atuam em um serviço hospitalar de urgência e emergência. |
Diversificação do público nos serviços de saúde, diferentes níveis de escolaridade dos profissionais de saúde, sendo os com maior escolaridade com maior nível de empatia. |
Rabelo et al., 2019 (Brasil) [18] |
IV |
Serviço hospitalar de emergência de um hospital da região Sul do Brasil. |
Analisar o processo de trabalho do enfermeiro em um serviço hospitalar de emergência. |
Superlotação, trabalho intenso e permanência do paciente mesmo após cessada a necessidade de atendimento agudo. |
Nyhus et al., 2017 (Serra Leoa) [19] |
IV |
Hospital Connaught, localizado em Freetown, na região da área Ocidental. |
Sustentar o desenvolvimento de enfermagem de emergência como uma especialização em Serra Leoa. |
Baixo nível de conhecimento sobre vários tópicos dentro dos cuidados de emergência, falta de trabalho em equipe e da autonomia do enfermeiro. |
Rahman, 2017 (Brunei) [20] |
II |
Departamentos de Emergência e Cuidados Intensivos nos hospitais públicos de Brunei. |
Fornecer uma exploração abrangente e estimar a exposição das variáveis de estudo entre enfermeiros de emergência e cuidados intensivos em Brunei e comparar se as experiências de enfermeiros de emergência diferem das enfermeiras de cuidados intensivos. |
Altas exigências quantitativas, ritmo de trabalho, stress e burnout. Além de, déficit nas habilidades e conhecimentos mais avançados de enfermagem. |
Atakro et al., 2016 (Gana) [21] |
IV |
Três hospitais públicos na região de Volta, em Gana, que tinham departamentos de emergência. |
Explorar os desafios enfrentados pelos enfermeiros gerais que trabalham em departamentos de emergência em hospitais. |
População crescente de pacientes, pressões financeiras, violência física, abuso verbal, ineficiências operacionais, superlotação e sobrecarga de trabalho. |
Fonte: Autores
A partir das análises dos artigos, foi possível verificar a existência de diferentes fatores que implicam em desafios para a assistência de enfermagem nos serviços de emergência hospitalar. As barreiras identificadas estão relacionadas à gestão do serviço e estrutura, bem como à força de trabalho da equipe assistencial.
Uma gestão inadequada pode resultar em superlotação do serviço de emergência e/ou escassez de recursos, que se configuram como desafios importantes na assistência de enfermagem, pois impacta diretamente na qualidade da assistência prestada aos usuários, e repercute também na saúde do trabalhador [9]. Em um estudo qualitativo exploratório, foi possível constatar que os enfermeiros expressaram que a superlotação e um ambiente de trabalho não propício são frustrantes, e representam riscos tanto para os profissionais, quanto para os pacientes [15].
Ainda sobre a gerência dos serviços de saúde, um estudo [12] afirma que a ausência ou inadequação de normas, fluxos e rotinas contribui para o desenvolvimento de distúrbios mentais entre os profissionais de enfermagem devido à falta de padronização de condutas, fragilizando a equipe no desenvolvimento de suas funções, como falta de clareza nas funções e tarefas a serem desempenhadas pelos enfermeiros, o que diminui sua autonomia.
O apoio gerencial inadequado também é um desafio nos departamentos de emergência, pois, para garantir cuidados de qualidade, é imprescindível que os gestores ofereçam o suporte e a atenção necessária. No entanto, a falta de escuta efetiva, a ausência de respostas às dificuldades dos enfermeiros e a presença de ações desmotivadoras impactam negativamente a capacidade dos enfermeiros de fornecer cuidados de qualidade aos pacientes [10].
No que tange ao profissional, encontram-se fortes evidências de que se sentir preparado para trabalhar na unidade de emergência tem forte relação com o conhecimento autopercebido para gerenciar emergências e as situações do cotidiano profissional [12]. A complexidade dos agravos no departamento de emergência exige tecnologia da informação em equipamentos médicos, conhecimento do profissional para aplicá-lo corretamente, e capacidade de comunicação entre a equipe multidisciplinar [10].
Os enfermeiros são membros fundamentais de qualquer sistema de saúde e a sua competência clínica é de importância crucial, especialmente no serviço de urgência. No entanto, alguns estudos [14,19], revelaram que a maioria dos enfermeiros atuando nessas unidades possuía apenas formação de graduação e não tinha treinamento especializado em enfermagem de emergência ou trauma. Embora estejam qualificados para exercer a profissão de enfermeiros, sabe-se que a formação generalista não proporciona competência suficiente para cuidados seguros e de alta qualidade no âmbito emergencista.
Por exemplo, é necessário que no processo da triagem, passo que determina a urgência e gravidade da condição do paciente, os enfermeiros utilizem habilidades de raciocínio clínico e conhecimento baseado em evidências para fazer julgamentos clínicos, e então, fornecer cuidados de enfermagem de emergência [11].
Fica notório nos estudos encontrados que o trabalho da enfermagem nas emergências é complexo, pautado no imprevisível, prestando cuidados críticos em ambientes por muitas vezes dinâmicos e de alto risco, com uma alta carga de exigência e responsabilidade, o que influi diretamente na carga de trabalho desses profissionais. Essa responsabilidade começa desde a avaliação inicial do paciente até a regulação e segurança do paciente grave ou potencialmente grave, configurando-se como um elemento estressor [7].
Em relação à saúde mental dos enfermeiros que trabalham na emergência, destacam-se alguns pontos encontrados nesta revisão integrativa. O estresse é um dos tópicos mais abordados, devido ao enfrentamento de situações imprevisíveis e complexas que exigem a rápida tomada de decisões. O estresse da falta de adaptação à situação pode resultar no manejo inadequado das ameaças contra a vida do paciente [22].
Outro desafio destacado por enfermeiros no pronto-socorro foi o abuso verbal de parentes e/ou acompanhantes. Muitos estudos mostram que os familiares dos pacientes às vezes eram agressivos com esses profissionais e abusavam verbalmente deles [21,23]. Uma pesquisa [22] comprovou esse fato, revelando que a maior prevalência de comportamentos ofensivos contra os enfermeiros inclui ameaças de violência (40,8%), seguidas por bullying (24,9%), violência física (18,9%) e assédio sexual (18,9%), sendo que os enfermeiros emergencistas possuem 4 vezes mais chances de vivenciar algum desses tipos de violência.
Ademais, pode-se acrescentar a disparidade entre o cuidado contínuo e o cuidado de emergência que provoca ao enfermeiro a deparar-se com uma perda de identidade em lidar com demandas limítrofes de vida. Ao passo em que seu processo de trabalho, em suma, é tomado pelo cuidado contínuo, perde-se a clareza de papéis e identidade de trabalho e, consequentemente, o controle do seu ambiente [18].
Outro fator agravante de extrema relevância é a diversidade do público atendido pelo serviço de emergência, pessoas com diferentes crenças sociais que, em alguns casos, infringem leis ao cometer roubos, homicídios, estupros, etc. E cabe ao profissional atuar com ética nessas situações que envolvem conflitos sociais e ideológicos, o que reforça a importância do comportamento ético e empático na assistência ao usuário do serviço [17].
Nesse contexto, é relevante pontuar que a humanização na prestação de cuidados ao paciente que se encontra em um estado de vulnerabilidade física e emocional é indispensável para uma recuperação mais rápida e atraumática. Entretanto, para a concretização desse ideal, são necessárias condições de trabalho favoráveis, especialmente no que diz respeito ao dimensionamento correto da equipe de enfermagem conforme a demanda do serviço, assim como o fornecimento dos insumos fundamentais [16].
Por fim, a discussão da temática é vital para melhorar a excelência do atendimento oferecido nas unidades de emergência, uma vez que identificar os desafios para uma assistência segura e de qualidade busca encontrar soluções para superá-los.
Os principais desafios enfrentados pelos profissionais de enfermagem no setor de emergência hospitalar estão divididos em duas áreas principais: a gestão dos serviços e estruturas, e a força de trabalho. Esses empecilhos são complexos e multifatoriais, influenciando diretamente a qualidade da assistência prestada aos pacientes.
Dessa forma, faz-se necessário que o serviço de saúde proporcione condições de trabalho adequadas, dispondo aos profissionais alternativas que os motivem, resultando em uma maior qualidade na execução de suas funções e, por conseguinte, reduzindo as barreiras que interferem na qualidade dos atendimentos.
Conflitos de interesse
Os autores declaram não ter conflitos de interesse de qualquer natureza.
Fontes de financiamento
Financiamento próprio.
Contribuição dos autores
Concepção e desenho da pesquisa: Sousa ENS, Pereira FGF; Coleta de dados: Sousa ENS, Sousa PSA, Sousa LC, Silva ICEC, Paixão WC; Análise e interpretação dos dados: Sousa ENS, Sousa PSA, Sousa LC, Silva ICEC, Paixão WC, Oliveira LB, Pereira FGF; Redação do manuscrito: Sousa ENS, Sousa PSA, Sousa LC, Silva ICEC, Paixão WC; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Oliveira LB, Pereira FGF.
Referências
1. Oliveira APS, Dias RS, Marques EF, Lima RS, Barbosa KT. O esgotamento físico dos enfermeiros no setor de urgência e emergência: revisão integrativa. Rev Nursing. 2019;22(251):2839-43. https://doi.org/10.36489/nursing.2019v22i251p2839-2843
2. Manso MLC, Mass SFL, Cavalcante JR, Lima VV, Cardoso C, Dias RS. Os desafios na sistematização da assistência de enfermagem em serviços de urgência e emergência. Rev Eletr Acervo Saúde. 2021;13(7). https://doi.org/10.25248/reas.e7986.2021
3. Chagas DC, Pereira DA, Castro FLM. Qualidade da assistência de enfermagem no setor de urgência de um hospital público de Teresina [Internet]. Rev Interdisciplinar. 2015;8(1):1-10. Available from: https://revistainterdisciplinar.uninovafapi.edu.br/index.php/revinter/article/view/360. Accessed 4 Aug. 2024
4. Delgado VR. Análise das vivências de enfermeiros de urgência no controle da dor da pessoa em situação crítica [Dissertação de Mestrado]. Bragança: Instituto Politécnico de Bragança; 2023.
5. García-Tudela Á, Simonelli-Muñoz AJ, Rivera-Caravaca JM, Fortea MI, Simón-Sánchez L, González-Moro MTR, et al. Stress in emergency healthcare professionals: the stress factors and manifestations scale. Int J Environ Res Public Health. 2022; 19(7):4342. https://doi.org/10.3390/ijerph19074342
6. Sousa KHJF, Damasceno CKCS, Almeida CAPL, Magalhães JM, Ferreira MA. Humanização nos serviços de urgência e emergência: contribuições para o cuidado de enfermagem. Rev Gaúcha Enferm. 2019; 40: e20180263. https://doi.org/10.1590/1983-1447.2019.20180263
7. Botelho LLR, Cunha CCA, Macedo M. O método da revisão integrativa nos estudos organizacionais. Gest Soc. 2011;5(11):121-36. https://doi.org/10.21171/ges.v5i11.1220
8. Agency for Healthcare Research and Quality (AHRQ). Quality improvement and monitoring at your fingertips. Rockville (MD): Agency for Healthcare Research and Quality; 2016. Available from: https://qualityindicators.ahrq.gov/. Accessed 4 Aug. 2024.
9. Benjamin E. The work of patient flow management: a grounded theory study of emergency nurses. Int Emerg Nurs. 2024; 74:101457. https://doi.org/10.1016/j.ienj.2024.101457
10. Wu C, He C, Yan J, Du J, He S, Ji Z, et al. Patterns of information literacy and their predictors among emergency department nurses: a latent profile analysis based on the person-context interaction theory. BMC Nurs. 2024; 23(1):1-10. 10.1186/s12912-024-01756-9
11. Oh WO, Jung MJ. Triage—clinical reasoning on emergency nursing competency: a multiple linear mediation effect. BMC Nurs. 2024; 23(1):1-9. 10.1186/s12912-024-01919-8
12. Karikari A, Amedjake D, Antwi J, Agyei-Baffour P, Mock C, Edusei AK, et al. The knowledge level of nurses managing critically-ill and injured patients in Ashanti Region of Ghana. Afr J Emerg Med. 2023;13(4):306-10. 10.1016/j.afjem.2023.10.003
13. Mass SFLS, Centenaro APFC, Santos AF, Andrade A, Franco GP, Cosentino SF. Rotina do imprevisível: cargas de trabalho e saúde de trabalhadores de enfermagem de urgência e emergência. Rev Gaúcha Enferm. 2022; 43. https://doi.org/10.1590/1983-1447.2022.20210007
14. Ndung’u A, Wambui M, Mwaura J, Mutua J. A cross-sectional study of self-perceived educational needs of emergency nurses in two tertiary hospitals in Nairobi, Kenya. J Emerg Nurs. 2022; 48(4):467-76. 10.1016/j.jen.2022.04.001
15. Agani AF, Abidi O, Gashi L, Beqiri M, Sahiti N, Cukaj S, et al. We are left with nothing to work with: challenges of nurses working in the emergency unit at a secondary referral hospital: a descriptive qualitative study. PLoS One. 2021; 16(2). 10.1371/journal.pone.0247062
16. Silva MRG, Marcolan JF. Working conditions and depression in hospital emergency service nurses. Rev Bras Enferm. 2020; 73(Suppl 1). https://doi.org/10.1590/0034-7167-2018-0952
17. Albuquerque MCS, Souza DFS, Maynart WHC, Bezerra LFD, Cassimiro ARTS, Cavalcante JC. Nurses’ empathy in an emergency hospital service [Internet]. Texto Contexto Enferm. 2019;28. https://doi.org/10.1590/1980-265X-TCE-2017-0406.
18. Rabelo SK, Silva MJP, Resck ZMR, Assunção E, Gontijo TL, Neves VR. Nurses’ work process in an emergency hospital service [Internet]. Rev Bras Enferm. 2020; 73(5). https://doi.org/10.1590/0034-7167-2018-0923.
19. Nyhus HB, Kamara MM. Quality improvement in emergency service delivery: assessment of knowledge and skills amongst emergency nurses at Connaught Hospital, Sierra Leone. Afr J Emerg Med. 2017; 7(3):113-7. 10.1016/j.afjem.2017.04.002
20. Rahman HA, Abdul-Mumin K, Naing L. Psychosocial work stressors, work fatigue, and musculoskeletal disorders: comparison between emergency and critical care nurses in Brunei Public Hospitals. Asian Nurs Res. 2017;11(1):13-8. https://doi.org/10.1016/j.anr.2017.01.003
21. Atakro CA, Ninnoni JP, Adatara P, Gross J, Agbavor M. Qualitative inquiry into challenges experienced by registered general nurses in the emergency department: a study of selected hospitals in the Volta Region of Ghana. Emerg Med Int. 2016; 2016:1-7. https://doi.org/10.1155/2016/6082105
22. Pons Claramonte M, Nieto Caballero S, Escribano Tortosa D, Contreras-Aguilar MD, Joaquin J, José J, et al. The stress experienced in an Emergency Medical Service (EMS): a descriptive study. Int Emerg Nurs. 2024; 74:101450. 10.1016/j.ienj.2024.101450
23. Freitas RJM, Pereira MFA, Lima CHP, Melo JN, Oliveira KKD. A violência contra os profissionais da enfermagem no setor de acolhimento com classificação de risco. Rev Gaúcha Enferm. 2017; 38(3). https://doi.org/10.1590/1983-1447.2017.03.62119