REVISÃO
O impacto das artes marciais como terapia suplementar para crianças com TDAH
The impact of martial arts as a supplementary therapy for children with ADHD
Marco Orsini1, Micheli Verginia Ghiggi2, Rolker Gracie1, Royler Gracie1, Antonio Rogerio Correia Nogueira1, Caroline Amorim Merçon Vieira1, Luciana Armada1
1Universidade Iguaçu (UNIG), Rio de Janeiro, RJ, Brasil
2Universidade Federal Fluminense (UFF), Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Recebido em: 31 de outubro de 2024; Aceito em: 20 de dezembro de 2024.
Correspondência: Marco Orsini, orsinimarco@hotmail.com
Como citar
Orsini M, Ghiggi MV, Gracie R, Gracie R, Nogueira ARC, Vieira CAM, Armada L. O impacto das artes marciais como terapia suplementar para crianças com TDAH. Educ e Inc. 2025;13(1):162-167. doi:10.62827//ei.v13i1.1001
Introdução: O Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é uma condição neuropsiquiátrica capaz de comprometer o desenvolvimento do indivíduo. O TDAH é caracterizado por níveis prejudiciais de desatenção, hiperatividade e impulsividade que se manifestam na primeira infância, sendo capaz de gerar comprometimento no convívio familiar e social, uma vez que há baixo desenvolvimento das funções executivas. Objetivo: Verificar, por meio da revisão de literatura, se as artes marciais podem atuar como uma terapia suplementar não medicamentosa para crianças e adolescentes diagnosticados com TDAH. Métodos: Trata-se de revisão de literatura sobre a prática de exercícios físicos como terapia suplementar não medicamentosa para paciente pediátrico diagnosticado com TDAH. As bases de dados consultadas foram: Scielo e Pubmed, a partir dos seguintes descritores: TDAH, Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade, Artes Marciais e Exercício Físico. Os critérios de inclusão foram: artigos publicados entre janeiro de 2010 e outubro de 2024, em português e disponíveis online. Resultados: As artes marciais são exercícios físicos baseadas em regras, em que a obediência é fundamental para êxito do esporte. Pacientes diagnosticados com TDAH possuem desenvolvimento social e cognitivo comprometidos, de forma que apresentam inabilidade em seguir regras e limites propostos. As funções executivas são as mais prejudicadas nesse transtorno, assim, é evidenciada instabilidade emocional, inabilidade em relação à memória de trabalho, dificuldade de planejar e executar tarefas e solucionar problemas diante das adversidades do meio. As artes marciais são capazes de auxiliar o paciente diagnosticado com TDAH no desenvolvimento de funções executivas, diminuindo a sintomatologia e melhorando prognósticos. Conclusão: As artes marciais, como esporte supervisionado, é uma forma de terapia não medicamentosa utilizada para suplementar à farmacoterapia, melhorando o prognóstico dos pacientes pediátricos.
Palavras-chave: Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade; Artes Marciais; Exercício Físico.
Introduction: Attention Deficit Hyperactivity Disorder (ADHD) is a neuropsychiatric condition that can impair an individual’s development. ADHD is characterized by harmful levels of inattention, hyperactivity, and impulsivity that manifest in early childhood, potentially leading to impairment in family and social life, as there is poor development of executive functions. Objective: To verify, through a literature review, whether martial arts can serve as a non-pharmacological supplemental therapy for children and adolescents diagnosed with ADHD. Methods: This is a literature review on the practice of physical exercise as a non-pharmacological supplementary therapy for pediatric patients diagnosed with ADHD. The databases consulted were Scielo and Pubmed, using the following keywords: ADHD, Attention Deficit Hyperactivity Disorder, Martial Arts, and Physical Exercise. The inclusion criteria were: articles published between January 2010 and October 2024, in Portuguese, and available online. Results: Martial arts are rule-based physical exercises in which obedience is fundamental for success in the sport. Patients diagnosed with ADHD have impaired social and cognitive development, which results in an inability to follow proposed rules and limits. Executive functions are the most impaired in this disorder, leading to emotional instability, difficulty with working memory, challenges in planning and executing tasks, and problem-solving in the face of environmental adversities. Martial arts can help patients diagnosed with ADHD in the development of executive functions, reducing symptoms and improving prognoses. Conclusion: Martial arts, as a supervised sport, is a form of non-pharmacological therapy used to supplement pharmacotherapy, improving the prognosis of pediatric patients.
Keywords: Attention Deficit Disorder with Hyperactivity; Martial Arts; Exercise.
O Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é uma condição neuropsiquiátrica caracterizada por níveis de prejudiciais de desatenção e/ou hiperatividade/impulsividade, que surgem na primeira infância e persistem ao longo da vida. O déficit de atenção, a impulsividade e a hiperatividade apresentados, trazem prejuízos significativos para a criança e para o adolescente no convívio familiar e social, no rendimento escolar, no desenvolvimento emocional, na sua autoestima e nas suas relações interpessoais, impactando negativamente a qualidade de vida dos afetados e resultando em declínio funcional [1,2,3,4].
O comportamento da pessoa com TDAH interfere de forma negativa no aprendizado, no desenvolvimento cognitivo e na vida social, vez que dificulta sua interação com a sociedade que a cerca, sendo evidenciada a dificuldade de manutenção de diálogos equilibrados, a execução de tarefas com precisão em longo prazo e a agressividade [2].
O diagnóstico do TDAH é clínico, sendo realizado por meio do preenchimento dos critérios estabelecidos no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), e classificado de acordo com o subtipo e gravidade. A proposta terapêutica é individualizada, seguindo as peculiaridades de cada caso, podendo ser oferecidas farmacoterapias e, de forma associada, terapias não medicamentosas [2,4].
As funções executivas são consideradas as principais contribuintes para as dificuldades vivenciadas pelos pacientes com TDAH, uma vez que a dificuldade de planejamento, inibição dos impulsos, atenção, foco, raciocínio, resoluções dos problemas e ajuste flexível às demandas são prejudiciais para esses indivíduos [3].
A prática de exercícios físicos tem demonstrado benefícios significativos nas funções executivas desses pacientes, incluindo melhorias na resolução de problemas, no planejamento e na execução de tarefas, assim como, na estimulação na memória de trabalho. O engajamento em esportes de forma abrangente também tem sido associado à melhora da autoestima, da orientação, do estabelecimento de metas, do comportamento social, da lealdade, da resolução de conflitos e da autoeficácia [3,4].
O objetivo do estudo é promover, por meio da revisão de literatura, a compreensão do impacto da prática de artes marciais, como terapia suplementar não medicamentosa para o tratamento de crianças e adolescentes diagnosticados com TDAH.
Trata-se de revisão de literatura sobre a prática de exercícios físicos como terapia suplementar não medicamentosa para paciente pediátrico diagnosticado com TDAH. As bases de dados consultadas foram: Scielo e Pubmed, a partir dos seguintes descritores: TDAH, Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade, Artes Marciais e Exercício Físico. Os critérios de inclusão foram: artigos publicados entre janeiro de 2010 e outubro de 2024, em português e disponíveis online.
As artes marciais são exercícios físicos baseadas em regras, em que a obediência é fundamental para êxito do esporte. Pacientes diagnosticados com TDAH possuem desenvolvimento social e cognitivo comprometidos, de forma que apresentam inabilidade em seguir regras e limites propostos.
As funções executivas são as mais prejudicadas nesse transtorno, assim, é evidenciada instabilidade emocional, inabilidade em relação à memória de trabalho, dificuldade de planejar e executar tarefas e solucionar problemas diante das adversidades do meio. As artes marciais são capazes de desenvolver as funções executivas diminuindo a sintomatologia e melhorando prognósticos.
Essa melhora se deve ao fato de a prática do esporte permitir a socialização, o controle da agressividade, a concentração e a estabilidade emocional, favorecendo o desenvolvimento das funções executivas, melhorando a qualidade de vida desses pacientes. Além disso, se destacam em razão da prática da luta, os estímulos provenientes dos processos pedagógicos, como a socialização, o respeito ao adversário e a adesão às regras do esporte [3,4].
Os pacientes pediátricos diagnosticados com TDAH que praticam lutas supervisionadas apresentaram melhora comportamental em comparação que não utilizam as artes marciais como terapia não medicamentosa suplementar [5,6].
O TDAH é uma condição grave que, segundo o Ministério da Saúde, afeta mais de 2 milhões de crianças e adolescentes. Frequentemente, esse transtorno ocorre junto com outras comorbidades neuropsiquiátricas, como ansiedade, depressão, Transtorno do Espectro Autista e Síndrome de Tourette [2].
De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), para ser diagnosticado com TDAH, o indivíduo deve apresentar um padrão de desatenção e/ou hiperatividade que atenda aos seguintes critérios: persistência dos comportamentos por no mínimo seis meses, início precoce (com sintomas manifestando-se até os sete anos de idade, mesmo que o diagnóstico possa ser feito posteriormente), interferência na capacidade funcional do indivíduo, e uma frequência e gravidade de desatenção, hiperatividade e impulsividade que sejam significativamente maiores em comparação com crianças e adolescentes da mesma faixa etária, prejudicando suas relações e convívio social [1,6].
A apresentação clínica do TDAH é heterogênea, com variações na gravidade e nos sintomas, sendo essencial tratamento o individualizado e acompanhamento por uma equipe multidisciplinar.
As funções executivas são as responsáveis pelo planejamento, pela inibição dos impulsos, atenção, foco, raciocínio, resoluções dos problemas e ajuste flexível às demandas. Essas funções são apontadas como o principal fator nas dificuldades rotineiras das crianças com TDAH, sendo subdivididas em controle inibitório, memória operacional e flexibilidade cognitiva.
O controle inibitório envolve a capacidade de resistir às alterações do meio interno e externo para completar uma atividade. A memória operacional refere-se à habilidade de manter e manipular informações temporariamente. Já a flexibilidade cognitiva é a capacidade de lidar com situações não premeditadas, buscando soluções alternativas para garantir o desempenho da tarefa executada. 3
Por terem o neurodesenvolvimento das funções executivas afetado, é necessário incluir no tratamento de pacientes diagnosticados com TDAH atividades que estimulem esse eixo. Uma variedade de defict observados no TDAH se enquadra nas funções executivas. No entanto, apesar da farmacoterapia auxiliar no tratamento da sintomatologia do TDAH, terapias não medicamentosas estão em evidência, com adesão também de equipe multidisciplinar [3].
As artes marciais podem favorecer o desenvolvimento das funções executivas, diminuindo a sintomatologia e melhorando o prognóstico dos pacientes pediátricos com TDAH. As habilidades adquiridas no treinamento de artes marciais podem favorecer o desenvolvimento das funções executivas e melhorar o desempenho do paciente, sendo fundamental para determinar o seu prognóstico.
A luta dá ênfase na disciplina e no autocontrole, o que paralelamente é uma dificuldade dos portadores do TDAH, visto que os indivíduos com esse transtorno apresentam como característica inabilidade em seguir regras e limites propostos. Além disso, auxilia no controle da agressividade e da estabilidade emocional, favorecem o estímulo à socialização, já que é exercício que é trabalhado em conjunto.
Os benefícios dos exercícios físicos são evidenciados com melhora da motricidade e atenção, em função do estímulo à síntese dopaminérgica, bem como melhor desempenho na capacidade de planejar e executar tarefas. Há melhora no índice de socialização, pois há desenvolvimento da função cognitiva, o que nos leva a concluir que a elevação do nível de dopamina pode estar associada ao melhor desempenho das funções executivas [4]
Essa prática esportiva pode ser utilizada como estratégia no desenvolvimento das funções executivas dos pacientes pediátricos, sempre respeitando sua singularidade e verificando a adesão do tratamento combinado a medicamentos [2,3].
Conclui-se que o exercício físico, especialmente as artes marciais, quando combinadas com terapia medicamentosa, mostram-se promissoras para melhorar o prognóstico de indivíduos com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH).
A prática frequente de artes marciais não só é capaz de reduzir os sintomas associados ao TDAH, como também pode ser um componente fundamental para melhorar a qualidade de vida desses pacientes. Através da inclusão dessa prática esportiva no cotidiano, os portadores de TDAH poderão experimentar melhorias significativas em suas atividades de rotina, promovendo um desenvolvimento mais equilibrado e funcional em suas vidas.
Conflitos de interesse
Os autores declaram não haver conflitos de interesse de qualquer natureza.
Fontes de financiamento
Financiamento Próprio.
Contribuição dos autores
Concepção e desenho de pesquisa: Orsini M, Ghiggi MV, Nogueira ARC, Gracie R, Gracie R, Vieira CAM, Armada L; Coleta de dados: Orsini M, Ghiggi MV, Nogueira ARC, Gracie R, Gracie R, Vieira CAM, Armada L; Análise e interpretação dos dados: Orsini M, Ghiggi MV, Nogueira ARC, Gracie R, Gracie R, Vieira CAM, Armada L; Análise estatística: Orsini M, Ghiggi MV, Nogueira ARC, Gracie R, Gracie R, Vieira CAM, Armada L; Redação do manuscrito: Orsini M, Ghiggi MV, Nogueira ARC, Gracie R, Gracie R, Vieira CAM, Armada L; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Orsini M, Ghiggi MV, Nogueira ARC, Gracie R, Gracie R, Vieira CAM, Armada L.
Referências
1. Rizzo MFT de, Paula C de. A importância do educador físico no desenvolvimento de uma criança com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). Rev Mackenzie Educ Fís Esporte. 2010;5(3). Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1980-65742010000300006. Acesso em: 15 jun. 2024.
2. Vieira PSA. A influência do esporte no desenvolvimento cognitivo de crianças com TDAH. São Luís: Centro Universitário UNDB; 2023. Disponível em: http://repositorio.undb.edu.br/bitstream/areas/949/1/PHELIPE%20SILVA%20VIEIRA.pdf. Acesso em: 24 out. 2024.
3. Dourado DSG. Efeito do treinamento de artes marciais no desempenho das funções executivas e nos sintomas do Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade em crianças de 9-12 anos. São Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; 2021. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/5/5141/tde-27082021-133857/publico/DaniloSanchezGouveaDouradoVC.pdf. Acesso em: 24 out. 2024.
4. Daou M, Perghergk GK. Contribuições da atividade física para o tratamento psicológico do TDAH em crianças. Rev Psicol IMED. 2015;7(1):42-51. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/5155066.pdf. Acesso em: 24 out. 2024.
5. Rodrigues MF. As lutas e artes marciais no auxílio a indivíduos com Transtorno de Déficit de Atenção - TDAH. Espírito Santo: Centro Universitário do Espírito Santo; 2016. Disponível em: http://repositorio.unesc.net/bitstream/1/4859/1/Mateus%20Fagundes%20Rodrigues.pdf. Acesso em: 24 out. 2024.
6. Paiano R, et al. Exercício físico na escola e crianças com TDAH: Um estudo de revisão. Rev Psicopedagogia. 2019;36(111):352-367. Disponível em: https://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-84862019000400010. Acesso em: 24 out. 2024.